Mittwoch, 30. Dezember 2009

Pergunto:

Independentemente das variantes locais, existe uma cultura europeia?

Mittwoch, 23. Dezember 2009

Epitáfio

Morreu esta madrugada, ou melhor está morrendo, pois nada do que é nobre morre num só momento, um dos seres mais queridos e importantes para mim....

O alpercegueiro de casa da minha avó (não é esta a ortografia canónica).

A enorme e bela árvore, com já quase meio século, não resistiu à intempérie da madrugada passada e rachou.

A juventude e a infância não regressam sabemo-lo bem, mas quando vemos algo que fez parte delas tão vividamente e que súbito desaparece ficamos perdidos em nós próprios...

Montag, 14. Dezember 2009

Bom conservadorismo e mau conservadorismo

Lá fora, os conservadores querem adaptar os valores tradicionais aos novos tempos, para que se mantenham e não deixem de fazer sentido.
Em Portugal, os conservadores querem sujeitar a modernidade à tradição, ao ponto de tirarem o sentido aos novos tempos.

Sonntag, 13. Dezember 2009

Ghazal 2152


(Para C. A. B.)


Whether I go east or west
or climb the sky
there is no sign of life
until I see sign of you
I was the ascete of a country
I held the pulpit
Fate made my heart
fall in love and
follow after you.

ad-Dīn Muḥammad Rūmī

Mittwoch, 9. Dezember 2009

Glosando o Mote «ao ver a sua alma envolta no escuro»


Ao ver a sua alma envolta no escuro;
Vendo o bruto peso da sua cruz,
Perguntei se eu era passado ou futuro;
Se para ela era sombra ou se era luz.


Ao ver a sua alma envolta no escuro,
Vi que se tinha apagado o meu céu
- Dia que morre, e não amanheceu;
Barco que naufraga em porto seguro.

Vendo o bruto peso da sua cruz,
Quis erguê-la como se fosse minha;
Quis morrer antes de ter de a ver sozinha;
Mas recusou-mo - e por isso propus:

Perguntei se eu era passado ou futuro;
Se podia coroá-la com a manhã;
Se era o seu anjo ou uma esperança vã
E se as suas chagas causo, ou se as curo...

Se para ela sera sombra ou se era luz
Mo disseram seus olhos, negro espelho:
...«és o passado, um triste sonho velho,
Que o teu amor pelo Inferno conduz!»


Filipe Bastos, 09.12.2009

Freitag, 4. Dezember 2009

Surrealismo - I


Vagas memórias de vagas nebulosas
Vagueiam, turvas, estalando como cometas;
Devagar, divagando e navegando poetas;
Tecedo-se em espumas de sonetos e glosas...




- Rafael Silveira Neves, 12/2009

Samstag, 28. November 2009

Poema breve

Brilhantes folhas
Dançantes leves
Inquietas s'agitam

Silêncio tumulto
Vivazes frescas
O dia quente filtram




21 de Novembro 2009
Pedro A. Cosme e S.

Donnerstag, 19. November 2009

Saída

Como a morte merecem
E memória alguma
Os sapientes senhores

Que criaram morais,
Os ascéticos costumes,
E vacuídades tais.

Basta. Não o queremos,
Vede como está podre
Vosso forte Behemoth

Não é a felicidade
Um estado ou espírito
Ela é sangue e alma

E há de surgir em glória
Fulva, queimando o ar,
No seu exortivo canto

19 de Novembro de 2009
Pedro A. Cosme e S.

Mittwoch, 18. November 2009

Vazio

A minha vida enoja-me
Com tanta força como a de,
Imersamente, existir
No seio do vazio, que

Forte se expande na alma.

Latejando que ressoa
Os longínquos sinos graves
Do Mundo que ver não se pode
Mas nele se crê e confia.

O Pensamento o contém.

Intangível, mais que sonhado
Ou almejado, é suposto.
Qual utopia de cristal
Em que o Eu a luz recebe.

Ah, porque é tudo sem luz?

Podia ao menos ser escuro
Assim repousaria quedo
Estando condenado certo
Não apenas entorpecido,

Nas águas tumultuosas.


17 de Novembro de 2009
Pedro A. Cosme e S.

Dienstag, 17. November 2009

Donnerstag, 12. November 2009

Mas já me viram estes cretinos?

Caros amigos,

Parece-me que me aproximo cada vez mais da opinião do Iko a respeito da religião...


Estou cada vez mais convencido que a fé é uma coisa magnífica... é só pena cair sempre nas mãos erradas, ou converter-se num monopólio de algumas instituições milenares sequiosas de poder e cegas pelo seu fanatismo fariseu e bolorento.

Como o comprovam estas bestas salazarentas, aqui: http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1417601!



(Nota: só responderei devidamente a comentários reclamativos/opinativos/proselitistas a rejeitar o casamento entre pessoas do mesmo sexo se me apresentarem UM ÚNICO argumento que não se reconduza ao "não gosto de ver, pronto" ou outros afins baseados na irracionalidade, em moralismos ou na absolutização do valor da tradição. Convençam-me que estou errado com argumentos de gente crescida, não com argumentos de doutrina social da Igreja.)





soldados jacobinos, França, 1793

Sonntag, 8. November 2009

Where Do You Go To (My Lovely)

Where Do You Go To (My Lovely)

You talk like Marlene Dietrich
And you dance like Zizi Jeanmaire
Your clothes are all made by Balmain
And there’s diamonds and pearls in your hair, yes there are.

You live in a fancy apartment
Off the Boulevard of St. Michel
Where you keep your Rolling Stones records
And a friend of Sacha Distel, yes you do.

You go to the embassy parties
Where you talk in Russian and Greek
And the young men who move in your circles
They hang on every word you speak, yes they do.

But where do you go to my lovely
When you’re alone in your bed
Tell me the thoughts that surround you
I want to look inside your head, yes i do.

I’ve seen all your qualifications
You got from the Sorbonne
And the painting you stole from Picasso
Your loveliness goes on and on, yes it does.

When you go on your summer vacation
You go to Juan-les-Pines
With your carefully designed topless swimsuit
You get an even suntan, on your back and on your legs.

And when the snow falls you’re found in St. Moritz
With the others of the jet-set
And you sip your Napoleon Brandy
But you never get your lips wet, no you don’t.

But where do you go to my lovely
When you’re alone in your bed
would you Tell me the thoughts that surround you
I want to look inside your head, yes I do.

You’re in between 20 and 30
A very desirable age
Your body is firm and inviting
But you live on a glittering stage, yes you do, yes you do.

Your name is heard in high places
You know the Aga Khan
He sent you a racehorse for Christmas
And you keep it just for fun, for a laugh ha-ha-ha

They say that when you get married
It’ll be to a millionaire
But they don’t realize where you came from
And I wonder if they really care, or give a damn

But where do you go to my lovely
When you’re alone in your bed
Tell me the thoughts that surround you
I want to look inside your head, yes i do.

I remember the back streets of Naples
Two children begging in rags
Both touched with a burning ambition
To shake off their lowly brown tags, they try

So look into my face Marie-Claire
And remember just who you are
Then go and forget me forever
But I know you still bear
the scar, deep inside, yes you do

I know where you go to my lovely
When you’re alone in your bed
I know the thoughts that surround you
`Cause I can look inside your head.

Peter Sarstedt


De bonnes raisons

Ton feu nourri de questions
Sur le pourquoi du comment,
De mon coeur et ses raisons,
Ne trouve pas de répondant

Je ne manque pas
De bonnes raisons pour t’aimer
Je ne vois pas
Pour quelles raisons te les donner
Mes bonnes raisons pour t’aimer
Pourquoi te les donner?

Est-ce ta jolie paire de fesses,
La peur de la solitude,
Le hasard et la paresse,
Ou une mauvaise habitude?

Je ne manque pas
(Pourquoi les taire?)
De bonnes raisons pour t’aimer
Je ne vois pas
Pour quelles raisons te les donner
(De bonnes raisons pour m’aimer
Pourquoi me les donner?)

Mon petit ange
Voudrait que je chante ses louanges
Gloria
Ma sainte relique
Demande son cantique des cantiques
Alléluia

Peut-être est-ce pour ton odeur
Ta façon de t’endormir,
Peut-être aussi pour ta soeur,
Ton argent ou encore pire

Je ne manque pas
(Pourquoi les taire?)
De bonnes raisons pour t’aimer
Je ne vois pas
Pour quelles raisons te les donner
Mes bonnes raisons pour t’aimer
Pourquoi te les donner?

Alex Beaupain

Freitag, 6. November 2009

Ausência


O que é isto?

Descobrimos a Luz nos reflexos do tumultuoso rio do Espírito e enchemos um frasco de perfume para nos recordarmos. A fonte secou... No meio da Escuridão usámos o frasco para nos encher a Alma. Então levantei-me para evitar que adormecesse e esquecesse... Mas quando me deitei tinha adormecido... Levantei-me calmamente e num beijo perguntei, lembras-te de mim?

André Cunha


Donnerstag, 5. November 2009

Homenagens Improváveis



Não presto a devida atenção a quem me a merece. Aqui fica esta homenagem acompanhada de uma pequena lenda chinesa que aprendi nas aulas de Mandarim. Foi-me dita ser a origem do mais importante feriado chinês, o Festival das Luzes Claras em que são honrados os mortos.

Forget Him

Há muito tempo, num dos reinos que viria a formar o Império do Meio, o país que actualmente conhecemos por China, existia um Rei que além da sua Rainha, tinha várias concubinas e filhos vários. Aquando da sua morte, uma concubina ciosa dos interesses do seu filho, através das teias da intriga conseguiu afastar do poder o Príncipe filho da Rainha, legítimo herdeiro ao trono.

Usurpado, o Príncipe fugiu para um exílio em terras desoladas e distantes juntamente com o seu séquito de fiéis. Durante anos vaguearam e um dia em que atravessavam terras ermas, fustigado pelo cansaço e pela fome, o Príncipe lamenta-se faminto ao seu mais fiel General.

Motivado pela necessidade do seu Senhor, o fiel General percorreu extensas distâncias procurando caça sem nada encontrar. Eis que quando o Príncipe já havia perdido a esperança que o seu fiel súbdito lhe conseguisse algum alimento, que este surge com a mais improvável das oferendas, uma refeição de carne.

Esfaimado, o Príncipe devorou a carne sem fazer perguntas até que finda, insatisfeito, pediu mais ao fiel General. Perante este pedido, o General destapa a coxa lancetada e diz calmamente, “Se o meu Príncipe quer mais carne, posso cortar mais um pouco.” Perante esta demonstração, o Príncipe rapidamente se refreou.

Anos passaram e o Príncipe e o seu séquito reuniram as forças necessárias para recuperar o poder anos antes usurpado. Assim foi, e o Príncipe regressou ao Reino como Soberano coroado em glória.

No frenesim da vitória e do regresso ao conforto após anos de sacrifício e privação, o Príncipe e o séquito que se tornou sua corte rapidamente entraram numa vida de luxo decadente e deboche no fausto do Palácio. Confrontado com esta situação, o enfermo General renegou a vida na corte e foi viver com a sua mãe como homem pobre, seguindo o estilo de vida a que se tinha habituado durante os anos do exílio.

Não satisfeito com esta situação, o agora Rei tentou conceder as maiores honras de Estado ao antigo General. Recebendo as oferendas do seu Senhor, o General agradeceu mas recusou todas as honras bem como regressar ao Palácio.

Não aceitando esta decisão por parte do seu súbdito, o Rei enviou um séquito militar para persuadir o seu querido General. Sabendo das intenções do seu Soberano, o General fugiu com a sua mãe para a Floresta na Montanha.

Ofendido com a fuga do General, o Rei enviou o exército para o ir resgatar à velha Floresta para que este aceitasse as honras oferecidas. O exército calcorreou a Floresta e encurralou o General na Montanha.

Fracassando em encontrá-lo e com a aprovação do Soberano, o exército decidiu cercar e incinerar a Floresta para que o velho General ao fugir das chamas, fosse finalmente resgatado para poder receber as honras devidas que havia recusado.

Mas enquanto a Floresta ardia, o General tardava em aparecer e quando finalmente ficou toda a Montanha coberta por nada mais do que cinzas, o General continuava desaparecido.

Inconformado, o Rei ordenou a procura dia e noite pela Montanha. Ao entrarem numa gruta, encontraram por fim o antigo General agora calcinado abraçado à sua velha mãe.

Consumido pelo remorso, o Rei declarou então três dias sem uso do fogo para honrar a memória do seu mais fiel súbdito.

Infelizmente fui certamente pouco rigoroso na reprodução da mesma mas tentei ser o mais literal possível em relação à versão que me foi instruída em respeito ao Professor Lu Yanbin. Mas se tiverem interesse podem sempre ver uma pequena variação da mesma lenda mais historicamente detalhada aqui mas na minha opinião penso que o tom que usei foi bem conseguido baseado no meu parco contacto directo com a cultura asiática.

Nota: Podem ver a imagem completa de uma gravura em panorama “Ao longo do Rio durante o Festival das Luzes Claras”, réplica datada do século XVIII do original do século XII carregando na imagem.

Mittwoch, 4. November 2009

Haiku - I








leaf falls from a tree


and returns to it


it was a butterfly

Okiya


Inaugurada está depois da primeira utilização como qualquer estabelecimento deste género que se preze.

Entre máscaras, laconismos e muita maquiagem, regozijemos, o anfitrião foi respeitado.

Chá?

Hitokiri



In the mellow sheets of the shredded sunset

Lies the warrior standing on his sheathed sword
There he is, eyes wide shut
Listening to her singing
Of that blade which protects him from previous raping
There he stands, supporting himself on the invisible aggression
That shattered blade he wields unknowingly on his defense
Even after sworn against it
That broken mirror that does not exist
It's all he has left to be

Before him, the crowds walk
Ignoring this old young shadow
He recognizes some faces
Remembering his unexisting life
Sorrow and regret bloom within his urge
He grabs the handle, ready to attack the peace...
Does he refrain?
Two tears are shed, only he remains...

André Cunha



Dienstag, 3. November 2009

Sahada

أشهد أن لا إله إلاَّ الله و أشهد أن محمدا رسول الله

«Não há nenhum deus senão Deus, e Maomé é o seu profeta.»

Destino

http://jornal.publico.clix.pt/noticia/01-11-2009/o-destino-da-europa-so-pode-ser-o-mesmo-dos-eua-uma-federacao-democratica-18125866.htm

Leiam e deleitem-se.

In Varietate Concordia!

Montag, 2. November 2009



Faltam-te pés para viajar?

Viaja dentro de ti mesmo,

e reflecte, como a mina de rubis,

os raios de sol para fora de ti.


A viagem conduzirá ao teu ser,

transmutará teu pó em ouro puro




Jalal ad-Dīn Muhammad Rumi, poeta persa (1207-1273)

Samstag, 31. Oktober 2009

Glosando o Mote «Ele viu a Alma da Vida»


Mote


Ele viu a Alma da Vida,
Adormecida no trono,
E acordou-a do seu sono
C'um beijo de despedida.


Glosa


Ansiando dançar nos ventos
E cantar até estar rouco,
Um dia um poeta louco
Afogou-se em pensamentos.
E andou na estrada tecida
A partir dos sonhos do Homem;
E nas luzes que o consomem
Ele viu a Alma da Vida.

Colheu rosas de cristal
- de cristalizado amor -
Para depor no fulgor
Da Torre celestial
De mudos muros de sono,
Onde pelos sonhos vela
Sua Guardiã, tão bela,
Adormecida no trono.

Nos doces olhos fechados
Encerrava a luz dos céus;
E o poeta viu que eram seus
Os sonhos que eram guardados.
Vendo o Anjo e o seu abandono,
Quis cantar aos ventos, rouco,
Que a amava e que era louco,
E acordou-a do seu sono.

«Eu sou o Sonho, a Alma da Vida,
Vagueio, em sono profundo.
Eu sou a poesia do Mundo;
Luz do dia - anoitecida;
E a tua noite - amanhecida.»
Disse, sorrindo, a Guardiã.
E sumiu-se, - até à manhã,
C'um beijo de despedida.
Filipe Bastos

Freitag, 30. Oktober 2009

A Verdade é Soberana Nesta Casa


Vivi sempre na cabeça e agora conheço o coração. Cabeça esta que sempre aspirou a coração mas que agora por ele se deixou enjaular. Cabeça esta que dita desesperada os termos da minha clausura e opressão mas que este coração rejeita levando-me a labirintos por onde sempre caminhei mas onde nunca me perdi, labirintos que para mim eram corredores bem definidos.

Agora já não sei agarrar-me e não sei onde estou. Levaram a minha tocha e perco-me no negrume do meu interior e fujo, fujo para não encontrar aquilo que sei que me espera no fim deste tango de silêncios, deste carrocel desvairado.

Sempre me pintei como a uma tela mas agora as tintas misturaram-se e já não encontro as cores. As correntes da minha ética partem e o ferro negro é cada dia mais vermelho e a cabeça não suporta e castiga-me com enlaces divinos.

Nem sei porque professo estas palavras, já perdi o seu significado, quanto mais vejo mais odeio este retrato que agora tenta ganhar vida das sombras que o contemplam.

Sombras de formas indefinidas que bailam entre chamas num reflexo de água cristalina que provoca a sede daqueles que a bebem escorrendo em suores frios pelas faces cavadas por um escopro afiado.

E é este o estupro em que consiste o sentimento. É monstro que nos desonra a alma, qual besta amordaçada que rasga com os dentes os quistos que lhe afloram pelo corpo que nos destrói dentro da jaula da nossa ética até ao dia em que se dissolve no sangue de uma intenção não concretizada.

É este o preço dos why should I’s quando se abdicou da urgência dos now’s e não se avança a braçadas largas nas torrentes dos why not’s.

É esta a face do pânico, da angústia não revelada, da cabeça que renega o coração que a domina e se encerra entre smoke and mirrors em personificações daquilo que não se permite que nasça fora das grutas da alma.

Estou esgotado…

A verdade foi parida. É um rebento grande e grotesco que não cabe pelo sifão da minha alma. Tirei-a de cesariana mas só a vi envolta em vestes ensopadas com este meu sangue. A quem anuncio o nascimento? Terá nascido morta? Antes de ser verdade já será mentira? Tem vergonha, por isso está envolta ou será que é a mãe que dela se envergonha?

Nas ilhas aladas, num baptismo de rapina, a Oliveira só dá flor, nunca o fruto.

André Cunha

Provérbio islâmico I



«Nenhum caminho que leve a um amigo é demasiado íngreme.»

provérbio árabe

O Divã Islâmico



As-salaam Aleikum.


Declara-se assim inaugurada a ala islâmica do nosso Jardim. Desde o momento da criação deste blog, já se previa como necessário que viéssemos a colocar posts de poesia, filosofia e cultura árabe, turca ou persa.

Agradecimentos ao Iko por me ter inspirado a este acto inaugural pela sua generosa oferta de um livro sobre Omar Khayyam.

A cultura islâmica é rica, e os bloguistas desta casa hão-de muito conversar e discutir com deleite teses de Averróis, ensinamentos do Profeta e versos de Rumi.


Maktub.

Mittwoch, 28. Oktober 2009

Não sei quanto a vocês, mas põe-me nervoso...

... o facto de neste momento o futuro de toda a União Europeia depender de uma decisão dos 15 juízes-conselheiros do Tribunal Constitucional checo. Parece que eles próprios ainda estão muito divididos quanto à não inconstitucionalidade do Tratado de Lisboa, já que adiaram a sua decisão para a próxima semana.

Coisa chata é a atitude do Presidente Klaus, eurocéptico que rejeita a Carta Europeia de Direitos Humanos por recear que dê aos descendentes de alemães do território dos Sudetas o direito de reclamar para si as terras dos seus antepassados expulsos pelos checoslovacos depois da Segunda Guerra Mundial.

Alguem me quer lembrar porque é que estes tipos estão na UE?

Dienstag, 20. Oktober 2009

Resposta ao Manifesto anti-Saramago

Eu diria que há, sensivelmente, duas maneiras de olhar para as escrituras. Ou a bíblia (como tantos outros textos religiosos) é uma das primeiras tentativas da humanidade à filosofia, à literatura, à cosmologia, à astronomia e até à medicina ou então é um texto de inspiração divina que existe para guiar o Homem à salvação.
Seja qual for, a bíblia é um documento de incomensurável valor, que sem sombra de dúvida, nos diz muito sobre as nossas origens e os primórdios da civilização.
No entanto, os anos trouxeram homens que, por seu próprio mérito contribuíram de tal modo para as acima enunciadas disciplinas que não só ergueram novos paradigmas como demonstraram o quão inadequados eram os anteriores. Estes homens são os degraus na escada da história da humanidade.

Eu defendo a ideia de que um livro escrito com inspiração divina que possa ter tantas falhas não é um livro escrito com inspiração divina. E não hesito em dizer também, que também o velho testamento tem passagens lindíssimas; e também não me custa dizer que um dos conceitos que Jesus ensina é o mais sinistro de todos os conceitos alguma vez encontrados nas escrituras.
Nem com todo o genocídio, violação e infanticídio no antigo testamento há uma menção do castigo dos mortos. A punição infinita por crimes finitos, crimes cometidos em vida, por acreditar no deus errado, por tudo e mais alguma coisa.

"Tenho más notícias para ti, és um ser impuro, pecador e estás condenado ao fogo eterno. Isto por crimes que foram cometidos antes do teu tempo, por crimes que foram cometidos por outras pessoas, o pecado original. (...) Mas também tenho boas noticias, se fizeres como eu mando e obedeceres a estas 10 regras, vais ter uma recompensa para além do que possas imaginar."

O medo do inferno que é incutido às crianças é algo de muito muito perverso. E espero que esta falácia seja óbvia a todos.

A bíblia é claramente a primeira das duas hipóteses. Custa-me saber que há homens meus contemporâneos que a tomam por algo diferente.
Quanto ao Saramago, não o chamaria ignorante e não me atreveria a dizer que ele não conhece a bíblia. Agora, a abordagem dele é indício de um homem velho e amargo, o que não o torna necessariamente errado.

Montag, 19. Oktober 2009

Manifesto anti-Saramago

Como grande parte de vós saberá, não tive nunca uma educação religiosa nem sou particularmente dado a beatices, apesar do meu interesse nas diversas religiões, sobretudo as monoteístas.
Contudo, o nosso único prémio Nobel da literatura - sinceramente, ainda hoje, nem percebi porquê... - parece não deixar de dar provas de que não só é ateu, que bom para ele, mas que deseja fazer uma cruzada de ignorância contra as religiões bíblicas.
Pior que uma cruzada medieval de fanatismo religioso é a cruzada ignorante, em pleno século XXI, de um fanático ateu que devia estar calado, não opinar sobre aquilo que desconhece, e perceber que ter um Nobel não lhe dá infalibilidade - para isso, estupidamente, teria de ser Papa.

Então o nosso amigo pretensio e inflado acha que a Bíblia é um manual de perversidade, de maldade, daquilo que de pior há na «natureza humana».

Antes de mais, aluda-se ao uso da expressão filosófica que Saramago usa, reconhecida até pelos metafísicos existencialistas como filosoficamente errada por pressupor um conjunto de características comuns a todos os seres humanos, inalteráveis e eternas. O que por si pressupõe que essa humanidade homogénea não se possa alterar, e que tenha sido já "criada" assim - mazinha!
Ergo, o nosso amigo ateu está a dizer que a Bíblia constitui um manual de maldade para uma humanidade naturalmente má. E ao fazê-lo, descuida-se com ideias cliché metafísicas:
1) Descuida-se com a pressuposição de que há uma «essência» humana eterna.
2) O que pressupõe o criacionismo.
3) Descuida-se ao arrogar-se o direito de fazer juízos de valor sobre o conteúdo de um texto que não conhece, aparentemente, o suficiente.
4) Descuida-se, ao apreciar condutas sugeridas na Bíblia como «boas» ou «más» - porque, a não ser que Saramago seja leitor assíduo dos filósofos morais mais influentes do pós-guerra, libertos de quaisquer tendências divinistas na sua filosofia ética, está a apreciar a Bíblia de acordo com os critérios do Bem ou do Mal da sua Civilização. Que são os critérios de fundamento metafísico e até teológico legados pelo Cristianismo baseado no texto religioso que critica.
5) Descuida-se, em geral, enquanto velho senil, incontinente e parvo que é.

É verdade que na Bíblia encontramos coisas simpáticas como o massacre dos primogénitos egípcios para libertar os judeus (Êx.,11, 5), a prescrição da exclusão de homens bastardos ou castrados das assembleias religiosas ( Deu., 23, 1-2), a exclusão de leprosos da comunidade (Num., 5, 2), a prescrição da pena de morte para adúlteros e homossexuais (Lev., 20).
Ora, a maior parte dos fanáticos ateus é cega o suficiente para se ficar por aqui, pelo Antigo Testamento, sem preocupações de interpretação ou de compreensão.
E que tal uma excursão pelo Novo Testamento?
Vemos a maldade de afirmar a humanidade como a luz do mundo (Mateus, 5, 14); a crueldade da rejeição da vingança (Mateus, 5, 38); a perversidade de afirmar as crianças como a esperança de Deus (Mateus, 19, 13); vemos o horror da proclamação da clemência como valor em si (João, 8, 7) e vemos a repugnância do perdão (Lucas, 17, 3).

Uma pessoa pode não concordar com grande parte do código moral contido na Bíblia. Mas ninguém deve ter o atrevimento de julgar um livro dessa dimensão e profundidade como um todo, dizendo que é tudo muito bom ou tudo muito mau.
O pior é que Saramago julga as partes menos simpáticas da Bíblia de acordo com preceitos das partes mais bonitas, que vagueiam no nosso subconsciente colectivo há dois mil anos.
É preciso ser-se um ignorante completo para fazer aquele tipo de afirmações.
Entristece-me que seja aquele o nosso único Nobel da literatura. Mas se quer escrever, escreva e cale-se.

Sonntag, 11. Oktober 2009

Em dia de eleições, calha bem.

Naturalmente, pode have excepções à regra, mas penso que...

Somos a geração do desapontamento, da descrença, da falta omnipresente de fé.
Há duas gerações, eram as ninhadas da infantilidade política alimentada pelo paternalismo de um Regime do tipo que nunca dura muito tempo. Infantis o suficiente para acreditarem estupidamente que o papá da pátria efectivamente tomava conta de tudo, e que o fazia bem.

A geração que nos antecedeu é a dos que tiveram esperança demais, depois desiludiram-se, e depois ficaram ocos no próprio cinismo. Ou então dos que permaneceram presos às suas convicções sem se darem conta de que o país mudou.

Mas nós somos os piores. Somos os que não aprenderam nada com erros dos avós e dos pais. Padecemos dos mesmos males que eles no breves momentos em que não vegetamos no descontentamento e na descrença.

À Direita ou à Esquerda, poucas pessoas conheço que sintam uma real confiança no nosso sistema de partidos. Toda a gente parece concordar, em termos mais ou menos correntes, que a teoria, encerrada na constituição, é muito bonita, "mas na prática"....
Acho que a grande causa da decadência da nossa democracia - a par de certos escândalos que são mais próprios de um tablóide que de um post desta digna comunidade - são os cancros que levam a que ninguém chegue a identificar-se plenamente com esta ou aquela força política.

Os maiores cancros da Esquerda portuguesa são dois: o radicalismo e a ingenuidade.
É o radicalismo de celebrar festivamente que uma mulher possa interromper a sua gravidez por escolha própria, em vez de chorar a necessidade da despenalização do aborto e sentir condolência pelo homem que, sem poder de decisão no assunto por ninguém conseguir encontrar uma solução ética ou jurídica para a sua posição, perderá o filho que queria ter e teve ilusões de imaginar no ventre da sua mulher.
É o radicalismo de defender com garras e dentes a legalização do consumo de drogas leves como se fosse um grande triunfo da Humanidade poder fumar charros; e não como se fosse o instrumento mais eficaz e potente para lutar contra o tráfico criminoso e gerador de violência, deixando o Estado ter o controlo total da comercialização de erva ou haxixe.
É o radicalismo de defender que toda a gente deve poder casar e adoptar, calando todas as objecções que dizem respeito ao são desenvolvimento dos adoptandos, e acusando quem as faz, recorrendo a ciências tão metafísicas e absurdas como a biologia, de conservadorismo salazarento.
E depois, há a sua triste ingenuidade.
É a ingenuidade de acreditar que qualquer um chegaria onde quisesse pelo trabalho, não fossem as trincheiras invisíveis da luta de classes; a ingenuidade de acreditar que há uma cisão na sociedade entre pessoas boas e trabalhadoras e pessoas ricas e poderosas. E perdem-se na ingenuidade de querer forçar uma igualdade artificial, ao estilo Robin Hood, perdendo as suas raízes ideológicas ao declararem uma guerra mais cerrada à riqueza, e não à pobreza e à exploração.

O maior cancro da Direita portuguesa é, assim o vejo, apenas um: a misantropia de acreditar que há pessoas boas e trabalhadoras, e pessoas preguiçosas e más. E obviamente, a maioria dos apoiantes deste tipo de ideologia diluída está incluida invariavelmente no lado dos «bons».
É a misantropia que os conduz - a de pensar que quem aborta, quem se prostitui, quem é homossexual, quem está desempregado há anos e décadas, quem vive de ajuda do Estado ou toma drogas tem geralmente a culpa de se encontrar na situação em que se vê, ou que tem algo de muito errado, feio e imoral que a sociedade tem de ignorar, desprezar, ou reprimir. E perdem-se na misantropia de achar que a única solução para a sociedade, pejada de pecado e torpeza, é dar o máximo de liberdade económica a toda a gente, porque a iniciativa privada é mágica, fuciona sempre - até há ciências sociais que o provam com gráficos catitas, vejam lá como isso é cómodo! - e acabará por dar a todos o que precisam; perdem-se na misantropia de acreditar que a solução para o resto dos problemas da sociedade é proibir, oprimir ou excluir - perdendo assim também as raízes cristãs que hipocritamente afirmam ter, relativizando o amor ao próximo e a humanidade que é a jóia esquecida da coroa do cristanismo (ou pelo menos... da mensagem de Cristo...).

Há que ouvir o que diz RAWLS. O professor de Harvard acusa a maior parte dos sistemas de fundamento democrático de se terem focado demasiado num de dois ideais trazidos pelo liberalismo político e tornados em estandartes da Revolução Francesa:
Os sistemas jacobino - por razões menos simpáticas, também conhecido por sistema "do Terror" - e soviético ou de inspiração marxista concentraram-se tanto na igualdade que a tornaram num eufemismo para opressão e uniformização à força. Mas traziam consigo o abandono do mérito em detrimento da opinião do colectivo.
As monarquias e repúblicas económica e socialmente liberais dos séculos XIX e XX tornaram a liberdade individual no seu grito de guerra. Fizeram do mérito uma justificação perversa manterem os olhos fechados para a exploração, para a miséria, e para o feudalismo socio-económico.
O que RAWLS sustenta é que, mais que igualdade ou liberdade, nos devemos concentrar na solidariedade, garantindo o maior espaço de liberdade individual possível compatível com a liberdade alheia, e assegurando a todos:
Não uma igualdade social;
Não uma liberdade económica e individual absoluta;
Mas uma igualdade de oportunidades para todos, de modo a que cada um possa ter uma possibilidade justa de ascender na vida - o que naturalmente não implica uma visão completamente liberal, antes um investimento massiço e prioritário no capital humano e na luta à miséria. O Estado não é mínimo, na proposta de RAWLS. É máximizador do potencial de todos.

Alguém lhe devia dar ouvidos.

Donnerstag, 8. Oktober 2009

No Meu País...



As ruas do meu país são bonitas mas estão vazias, são largas e monumentais avenidas antigas que no entanto não acusam a mais leve passagem do tempo. Há muitas paradas, mas não se faz lixo ou mácula. As cidades são coerentemente eclécticas, não há uma rua igual à outra. Na malha ortogonal cruzam-se todas as eras e civilizações sem nunca se mesclarem entre si, cada rua é coerente consigo própria.

No meu país as pessoas discutem muito, mas nunca se zangam. Discutem racionalmente tudo o que é e não é passível de assim ser discutido. Filosofia, ciência, humanidades, amor, ódio,…

No meu país as pessoas não se conhecem, não frequentam as casas umas das outras, não há famílias. Reúnem-se em cafés, bares, salões e festas. Ninguém se apercebe do clima que caracteriza o meu país porque tudo é invariante a este. As pessoas prosseguem sempre os mesmos hábitos, vestem-se sempre da mesma forma.

Há ainda assim muita diversidade mas tal como as ruas, não se mistura como água e azeite e é assim nas pessoas, na natureza, nas paisagens, em tudo.

O meu país é uma ditadura mas ninguém sabe quem a dirige. Os serviços secretos são um poder sem rosto desta força desconhecida que o dirige.

O exército é imenso e interminável mas é incapaz, inapto para a luta. Vestem fardas ornamentadas e possuem inúmeros rituais. Há planeamento e rigor de todas as eventualidades e possíveis acontecimentos militares, mas ninguém, nesta massa humana sabe pegar numa arma para fazer a guerra.

Somos um país imenso e excessivamente organizado. Este nosso exército imenso e maquinal assusta as outras nações, não temos guerra.

Os serviços secretos asseguram aquilo que a inépcia do exército nunca poderia evitar e eliminam as possibilidades de conflito mas se nos invadem, vamos à vida.

No meu país, as crianças só saiem de noite. No meu país todos os cidadãos possuem uma infinidade de títulos, cargos e responsabilidades oficiais. Como toda a gente ocupa todos os cargo em todas as áreas não existe uma verdadeira hierarquia. Somos um povo orgulhoso e vaidoso, mas não nos lembramos porquê.

No meu país somos todos muito diferentes em aspecto, mas no fundo somos todos iguais. No meu país os sentimentos não florescem, transformam-se em livros, poemas, tratados, artigos, ensaios… Temos milhões de bibliotecas intermináveis em que toda esta obra acaba depositada e esquecida. As bibliotecas são tão extensas, os seus corredores tão longos e labirínticos que ninguém ousa visitá-las, foram projectadas com esse propósito.

No meu país não temos telefones, só escrevemos cartas. Não existe televisão mas fazemos muito cinema, teatro e televisão também só que os filmes nunca são terminados e as cenas sucedem-se, as peças de teatro são ensaiadas sem término, os programas televisivos são gravados e regravados mas nunca são lançados. Assim é toda a arte no meu país.

Ensaiamos, experimentamos, pensamos e concebemos mas nunca terminamos, a obra é por definição inacabada, as obras não são lançadas apesar de termos sempre datas planeadas para o fazer, datas essas que se prolongam pelos séculos. Temos grandes movimentos artísticos, orquestras, estúdios, ateliers, escolas… As orquestras não actuam, ensaiam; os pintores não expõem, experimentam porque nenhum artista consegue obter aquilo que imagina, a perfeição não converge, então para sempre ficam no estado de concepção.

Ninguém sabe ao certo quantas pessoas existem neste país meu. Como as pessoas fazem um sem fim actividades e ofícios e ocupam uma infinidade de títulos e cargos e hierarquias, toda a gente é tudo e nada, parecemos ser biliões mas podemos não passar de uma dezena, ninguém sabe.

No meu país as pessoas têm muitos nomes, como se sentem presas por apenas um, adoptam milhares de nomes, não há minuto que passe sem que um novo nome lhes surja.

No meu país as pessoas não morrem e são sempre jovens fisicamente. Acontece que um dia ficam simplesmente catatónicas. Não as enterramos porque estão vivas, então ficam nas ruas como estátuas, a nossa única arte que se conclui porque ninguém distingue estas pessoas de objectos inertes.

No meu país não acreditamos em Deus mas temos grandiosos templos de todas as religiões; tal como a maioria dos sítios neste meu país, encontram-se quase sempre vazios.

As pessoas passam os dias nas ruas vazias e extensas a discutir e a passear.

São as crianças que constroem o meu país. De noite, quando saiem, invadem uma qualquer zona e erigem quarteirões, ruas e bairros inteiros numa só noite.

Os serviços secretos que tudo controlam não as conseguem ver, aliás a partir dos 12 anos, as crianças no meu país são adultas e deixam de ver as crianças, os adultos não as vêem, só se recordam delas da sua infância.

Por isso ninguém sabe onde vivem, donde vêm e quem são. Rumores falam dos esgotos monumentais mas ninguém lá vai.

As pessoas do meu país como conquistaram a imortalidade, não têm necessidades fisiológicas. Não comem, não defecam, não nada. Ainda assim temos casas de banho, hospitais e todo o tipo de estrutura associadas à natureza do animal humano. Essencialmente assim acontece porque temos que ter profissões.

Por exemplo, temos médicos mas nenhum deles saberá intervir se necessário. São sábios e escrevem longos tratados e extensos artigos profusamente descritos até ao mais ínfimo detalhe, ilustrações, cálculos e deduções mas nunca ninguém na realidade experimentou nada.

Não temos cemitérios, as pessoas vão ficando pelas ruas, tiram-nas do caminho e usam-nos como ornamento nos parques e jardins porque não morrem, ficam catatónicas.

Há muitas mães no meu país mas nenhuma delas sabe quem são os seus filhos. Não se lembram que os tiveram e como tal nem sabem que o são, mães. Os adultos no meu país não se despem, vestem sempre a mesma roupa, trajes elaborados que diferem em estilo, era e espírito mas que são sempre cuidadosamente elaborados mesmo que fossem andrajos. Podem andar sempre imutáveis porque não possuem necessidades fisiológicas.

Tivemos três guerras no meu país. Tivemos uma primeira guerra ideológica que terminou num armistício que fundiu as forças opositoras.

A segunda guerra foi um artifício de propaganda, nunca tendo ocorrido na realidade. A imprensa anunciou a guerra, as tropas foram mobilizadas e todos acreditam que houve porque somos um país tão grande que toda a gente ouviu falar de alguém que esteve nessa guerra fora das nossas fronteiras mas ninguém conhece ninguém que realmente lá tenha estado até porque nunca ninguém neste país se aproximou sequer das fronteiras do nosso extenso território. Foi uma guerra inventada pelos serviços secretos.

Por fim, a última guerra que nos assolou foi uma invasão estrangeira. O inimigo enviou milhões de soldados mas nunca os suficientes para fazer face aos nossos territórios intermináveis, às nossas cidades infinitas, havia sempre mais ruas, mais esquinas, mais avenidas e o exército do inimigo acabou por se desfazer na nossa imensidão como o exército francês na Rússia. Ninguém sabe porque fomos invadidos ainda hoje, muito se escreve sobre o assunto.

Diz-se à boca pequena que vivemos em guerra civil permanente mas ninguém sabe ao certo entre quem e não há sinais óbvios de guerra civil. Dizem os rumores que se deve à intervenção dos serviços secretos na gestão do conflito, que cuidadosas operações de limpeza e abafamento são levadas a cabo e nesses sítios as pessoas supostamente discutem mais ou ficam silenciosas e as ruas supostamente são mais limpas, mas na realidade não passam de boatos porque ninguém neste país sabe usar uma arma ou levantar os braços para agredir quem quer que seja mas tornámo-nos vítimas do nosso poder sem rosto.

Não há carros no meu país. Só andamos a pé. Os carros não servem para nada precisamente porque o país é tão extenso que ir a qualquer lado a pé ou de carro é irrelevante, como somos imortais o tempo não significa nada para nós e como tal nunca temos muita pressa de chegar onde quer que seja. Há ainda assim, quem tente atravessar o país inteiro a pé.

Não conhecemos outros países embora tenhamos milhões de embaixadores, diplomatas, geógrafos, mapas e estudos étnicos mas nunca ninguém foi a lado nenhum na realidade. Ficámos fascinados aquando da última guerra precisamente porque fomos visitados mas ainda hoje há dúvidas se esse invasor não tenha surgido meramente dentro do nosso país a partir dos fenómenos de diferenciação que já descrevi.

Há auroras boreais no meu país. Como as realidades não terminam neste meu país, não temos museus porque simplesmente não percebemos o conceito. O tempo não começa nem termina nem se move, não há velho nem novo, há sempre mais, mas tudo o que houve se mantém. Não sabemos o que é antigo, não sabemos o que é não ser o que já se foi. Existe sempre tudo.

André Cunha

Dienstag, 29. September 2009

«És uma sombra...»

És uma sombra nocturna de luz celeste,
Nobre, doce e dócil como as estrelas de outrora,
O Anjo áureo que leva os beijos da aurora,
Mais brilhante e rubra desde que amanheceste.

Rafael Silveira Neves, 29/09/09

Alguns comentários...

O comentário do Filipe:

O meu conterrâneo Açoriano preferido...


Creio que acaba por ser verdade. Todos - até certos elementos de esquerda revolucionária ou revisionista desta comunidade - têm em si um embrião de conservadorismo, que a força das circunstâncias não permite senão abortar.

Note-se que Antero de Quental foi membro de um dos primeiros partidos de orientação Proudhónica e proto-marxista em Portugal. Não foi por isso que deixou de fazar brilhar na sua obra poética e filosófica sempre um temor religioso muito micaelense, muito açoriano, um misto de amor profundo a Deus e à "sagrada família", respeito, confiança e fé - por regra, relativamente emancipadas de uma dependência intelectual e religiosa ao Vaticano.
Antero de Quental foi um tipo religioso, conservador, sim - mas tinha bestunto e soube ver que numa sociedade atrasada que vivia um feudalismo capitalista semelhante ao que temos ainda hoje, a resposta a dar era o compromisso entre a vontade e as crenças do povo, sejam elas quais forem, e a modernidade de Esquerda da luta à opressão e exploração.

Não vejo como se possa censurar a orientação de Quental.
Aliás, há muita gente que se devia perguntar, por aí, se a sua natureza não será antes revolucionária, e o seu espírito breve conservador.

Filipe


A minha resposta:

A natureza individual, aponta-nos e indica-nos sempre caminhos sedutores por mais tortuosos e imbecis que nos apresentem, a natureza puxa-nos e guia-nos nessa viagem inútil.

Agora o espírito... Quem é que sabe domar o espírito? No decurso do caminho somos sempre atacados pelo espírito, ele pode ser oculto e breve nas suas manifestações, mas ofusca-nos sempre da linha que a natureza nos traçou e deixa-nos completamente perdidos. Exige de nós aquilo que a natureza não nos concedeu, força-nos com a sua necessidade, porque é ele o último reflexo da nossa alma por mais que esta esteja trabalhada pela nossa natureza. Se calhar falo de mim e não de Antero quando emito estas breves linhas, mas em mim, a natureza é conservadora; agora o espírito, esse génio maldito que amaldiçoo e abençoo, essa torrente de águas revoltas e límpidas em que incide a luz da minha alma, esse será sempre revolucionário no sentido geral do termo. E será ele que me irá dar a paz, quer me afogue nessas águas, quer nelas mate a sede.

E mesmo quando acho que me vou afogar, continuo sempre com a mesma sede... Será essa sede o espírito e não as águas que acuso? Não sei dizer, não sei avaliar. Estou vazio agora e a natureza retoma em mim o seu caminho, não há lâmina que me corte esta mão, nesta indefinição há muito que estou talhado ao milímetro.

E acho sempre que açoriano se escreve açoreano e isto antes da companhia de seguros. Mas pronto, para mim, dançar será sempre dansar, não sou o primeiro nem o último, sou apenas mais um.

Escrevo sem nexo, agora reparo, nem sei porque vomito estas palavras, a insónia permanece e nem revejo. As palavras saiem desconexas sem tempero nem tempera, assim me encontro, assim aguardo.

Não sei o que digo nem se digo alguma coisa, as rosas são ainda brancas e a sua luz queima-me por mais que me digam que não, que são serenas e belas.

As imagens fundem-se e o sono não chega, estou calmo agora, a natureza retoma-se em mim e o espírito adormece lentamente mais uma vez para se esconder atrás desta nova criação.
Não me compreendo nem compreendo, a bússola gira em torno de si própria e a terra é vermelha, mas as rosas são brancas. Gosto do azul mas não acredito nele, falam-me do vermelho, conheço o branco, sinto o azul e o azul tinge o meu vermelho porque o vermelho não conheço, só o branco.

A fotografia devassa-me o espírito, e a máscara tomou conta da natureza ou será que foi a natureza que se mascarou? Não penso, não reflicto, não sinto, não choro, não amo, não odeio, não durmo, escrevo sem parar e o dicionário repreende-me, o teclado tem saudades da caneta, e eu só tenho uma caneta, está na mala.

Procuro algo entre um piano e um violino, o piano é a minha natureza mas o violino é o meu espírito e eu estou no meio. As cordas estão ká, o som sai, mas o violino não toca e o piano apressa-se, a uma mão, a duas mãos, a quatro mãos e eu não sou virtuoso, o arco parou e os braços caíram mas os dedos continuam frenéticos no teclado, não conhecem as teclas porque só se lembram das cordas e em cada tecla esperam encontrar o corte da corda mas a tecla é pesada e soa antes de saber que a premi.

Assim me esqueço da música e recordo apenas o som. Um som que chove, que gotícula e perde a forma que o definia, os homens correm e não pensam e já não formam um colectivo, tornaram-se um a um em homens mas em homens que se tornaram já não o são antes ainda de o serem e agora não pensam, eu não penso, fogem, será que fujo?

Ousado estou, porque não estou, não sou e como tal é fácil ser o que se não é porque o que se é nunca chega a ser e eu nunca chego a ser o que sou porque aquilo que sou nunca é nem chega a ser porque não percebo estas palavras que se apropriam das minhas mãos, das mão que não quer ser ferida, que permanece incólume como nasceu e ela envelhece mas não muda, e dizem-me que é bela, bela porquê? Será o seu gesto ou a sua forma, talvez ambos, a lixívia tirou-me a cor mas o indigo suja-me as mãos brancas que procuram o sangue. Mas o sangue não corre e a tinta tarda em chegar, todos se maquiam.

E não páro, não consigo, escrevo, escrevo mas não digo nada. As palavras amontoam-se e os pensamentos não chegam a ser nada, esfumam-se antes que lhes permita formar, nascer, cristalizar, assentar. Nuvens de pó, será fumo? continuam e eu não consigo ver nada, os olhos estão secos, a pele está cansada. Vou fechar o livro.

Que quero dizer? Que quero afirmar? Será que quero o quer que seja? Não sei parar, o livro não fecha, a água inunda-me a casa e vomitei na casa de banho, limpei o que pude mas o cheiro enjoativo e bilioso possuí-me as narinas, controlo a náusea mas não percebo, olho-me com desdém e no espelho acho-me belo no meio desta putrefacção que me rodeia. Sublinho que nada digo, mas tudo escrevo, porque nada tenho para dizer nem sei se digo, mas não consigo parar, os dedos continuam na ponta dos braços inertes. Não sei fazer nada mas tudo faço e no fim nada fiz, não consigo parar porque o espírito encontrou a natureza e não falam a mesma lingua, usam um intérprete de Bruxelas que recebe dinheiro a mais mas não eprcebe nenhuma das línguas porque só fala português. Mas a natureza é surda e o espírito só sabe gritar e o intérprete é um idiota. Perdeu-se mas continua, e sem saber o que traduz, inventa, ou melhor, aldraba, engana e burla nem sabe bem o quê até porque não se lembra, perdeu a memória e deixou de ficar triste embora não tenha ficado muito contente porque palavra atrás de palavra a todas anulou porque não sabe nada. É um idiota.

São 3:33, não 3:34 agora é feio, o três é bonito, parece um infinito incompleto mas agora já passou e já são 3:34. Tenho aula de Quântica às 11, é melhor tentar dormir porque acordo cedo. Minto, não vou acordar cedo mas tenho aula, vou lá mas vou ficar de fora mesmo que me vejam porque me vêem sempre mas nunca me tocam. E eu também não toco, tenho nojo e uso sempre luvas.

Olha que fofinho, transformei um substantivo em verbo.

Encontrei uma ave de fogo e estou a sagrar a minha Primavera, no penúltimo dia saberei mais, recupero-me lentamente, a realidade desenha-se aos poucos e recordo-me de mim, agora compreendo o jogo de cartas mas continuo sem saber jogar, jogo sempre ao acaso mas acham que jogo bem e muito. Agora sim, tenho sono e já vejo novamente pelos pesados olhos, são 3:47 e não paro. Um 3 desdobrado devia ser inifnito mas afinal dá 8 e eu nunca soube fazer contas. Pronto, assim sou nestas horas.

Montag, 28. September 2009

Blue Roses

Roses red and roses white
Plucked I for my love's delight.
She would none of all my posies -
Bade me gather her blue roses.

Half the world I wandered through
Seeking where such flowers grew.
Half the world unto my quest
Answered me with laugh and jest.

Home I came at wintertide
But my silly love had died
Seeking with her latest breath
Roses from the arms of Death.

It may be beyond the grave
She shall find what she sould have.
Mine was but an idle quest -
Roses white and red are best!

Rudyard Kipling

A natureza, em mim, é conservadora; só o espírito é revolucionário.

Há em todos nós, por mais modernos que queiramos ser, há lá oculto, dissimulado, mas não inteiramente morto, um beato, um fanático ou um jesuíta! Esse moribundo que se ergue dentro de nós é o inimigo, é o passado. É preciso enterrá-lo por uma vez, e com ele o espírito sinistro do Catolicismo de Trento.

A natureza, em mim, é conservadora; só o espírito é revolucionário.

O Hegelianismo foi o ponto de partida das minhas especulações filosóficas, e posso dizer que foi dentro dele que se deu a minha evolução intelectual.

A grande revolução… só pode ser uma revolução moral, e essa não se faz de um dia para o outro nem se decreta nas espeluncas famosas das conspirações, e, sobretudo, não se prepara com publicações rancorosas de espírito estreitíssimo e ermas da menor ideia práctica.

… Mais preciso pôr-me em comunhão com a alma colectiva.

… Fui sempre amigo de me achar em minoria.

… É preciso também chorar e amar aquilo mesmo que nos faz chorar.

Vou percebendo que o pessimismo de [Karl Edward von, 1842 – 1906] Hartmann se parece singularmente como o meu optimismo… Talvez eu tenha inventado a Filosofia do Inconsciente sem o saber!

… Choro – mas não me envergonho de chorar.

Eu cá vou indo. Cada vez mais místico e penso que daria um sofrível monge, se não fossem estes nervos miseráveis, inimigos da paz de espírito. Querem alguns dizer que muitos santos foram histéricos e nevróticos. Não posso crê-lo. Este estado de nevrose é o menos favorável à serenidade interior e, por conseguinte, à santidade.


Mas quem de amor nos lábios traz doçura
Esse é que leva a flor de uma alma pura!

Só no meu coração, que sondo e meço,
Não sei que voz, que eu mesmo desconheço,
Em segredo protesta e afirma o Bem!

E os que folgam na orgia ímpia e devassa
Ai! quantas vezes ao erguer a taça,
Param, e estremecendo, empalidecem!

Ausentes filhas do prazer: dizei-me!
Vossos sonhos quais são, depois da orgia?
Acaso nunca a imagem fugidia
Do que fostes, em vós se agita e freme?

Um século irritado e truculento
Chama à epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obuz…

Mas cruzar, com desdém, inertes braços,
Mas passar, entre turbas, solitário,
Isto é ser só, é ser abandonado!

Assim a vida passa vagarosa:
O presente, a aspirar sempre ao futuro:
O futuro, uma sombra mentirosa.

Antero de Quental

Sonntag, 27. September 2009

As-tu déjà aimé

Porque é que eu me sinto tanto nestes impasses ... e tanto do lado do "bretão".....


As-tu déjà aimé
Pour la beauté du geste?

As-tu déjà croqué

La pomme à pleine dent?
Pour la saveur du fruit
Sa douceur et son zeste
T'es tu perdu souvent?

Oui j'ai déjà aimé
Pour la beauté du geste

Mais la pomme était dure.

Je m'y suis cassé les dents.

Ces passions immatures,

Ces amours indigestes

M'ont écoeuré souvent.


Les amours qui durent

Font des amants exsangues,

Et leurs baisers trop mûrs

Nous pourrissent la langue.


Les amour passagères
Ont des futiles fièvres,

Et leur baiser trop verts

Nous écorchent les lèvres.


Car a vouloir s'aimer
Pour la beauté du geste,

Le ver dans la pomme

Nous glisse entre les dents.

Il nous ronge le coeur,

Le cerveau et le reste,

Nous vide lentement.


Mais lorsqu'on ose s'aimer
Pour la beauté du geste,

Ce ver dans la pomme

Qui glisse entre les dents,

Nous embaume le coeur,

Le cerveau et nous laisse

Son parfum au dedans.


Les amours passagères
Font de futils efforts.

Leurs caresses ephémères

Nous faitguent le corps.


Les amours qui durent
Font les amants moins beaux.

Leurs caresses, à l'usure,

Ont raison de nos peaux.

Sonntag, 20. September 2009

Setas Ateias


«Certo dia, quando atravessava o Deserto, encontrei um poeta louco e herético no caminho. Nada fazia senão olhar para o céu com desdém desafiante e cantar:


«Num copo de vinho, vi a alma de Deus,
Tão embriagado que julgou estar nos céus,
Morrendo afogado sem sequer ter nascido.

Com alexandrinos faço a guerra aos céus,
Deus tem os seus anjos, estes versos são meus,
E são setas que O destronam, como eu, perdido.»


E nunca compreendi o que queria dizer.»
Rafael Silveira Neves, Agosto de 2008

Samstag, 19. September 2009

Die Engel (os Anjos)


Das Kind ruht aus vom Spielen,
Am Fenster rauscht die Nacht,
Die Engel Gotts im Kühlen
Getreulich halten Wacht,

Am Bettlein still sie stehen,
Der Morgen graut noch kaum,
Sie küssens, eh sie gehen,
Das Kindlein lacht im Traum.


- Joseph Freiherr Von Eichendorff


«A criança descansa da brincadeira,
À janela, a noite murmura,
Os anjos de Deus, no frio,
Vigiam fielmente,

Estão junto da cama,
Ainda nem o cinzento da manhã veio,
Eles beijam-na, antes de irem,
E a criança ri enquanto sonha»

Sonntag, 13. September 2009

Inscrição Tumular



«Aqui jaz em paz a minha vida,
A vida que deixei para trás;
Vim encerrar-me nesta jazida,
Porém, não sou Eu quem aqui jaz.»
- Rafael Silveira Neves

Samstag, 12. September 2009

Constatações

De notar como se torna realidade inabalável a teoria de Aristóteles que afirma que a Natureza tem horror ao Vácuo... Pelo menos eu tenho àquele que se instala no meu ânimo...

Sonntag, 6. September 2009

Samstag, 5. September 2009

Algo está podre em vários reinos...

Há assuntos que devem ser debatidos com toda a simplicidade, por isso vou começar por vos contar uma história...

Ontem sensivelmente a meio de um passeio que fiz com um amigo meu, repousamos num café que costumo frequentar (e recomendo, o Fba no bairro alto) onde me pus a viajar por entre as várias prateleiras de livros que este tem... Até que, por fortuito acaso do destino, me deparei com um livro de suposta educação sexual, e já compreenderão o meu "suposta", este livro, tomando partido de uma personagem conhecida da animação infantil francesa, apresentava os varios e tortuosos meandros da sexualidade e do sexo de uma forma clara, direcionada e doutrinada não fossem os meninos adolescentes e pré-adolescentes a quem o livro se dirigia perder-se nesse horrível pântano da existência que é o sexo e a sua vivência. Vejamos os três pontos fulcrais do livro, completamente errados (na minha perspectiva claro):

Numa primeira parte, de pendor ciêntifico eram apresentadas as mudanças corporais e de comportamento da puberdade, neste primeiro ponto deu-se o primeiro deslize... caindo no ridículo, numa das páginas, muito ilustradas, explicava-se que os rapazes não têm o periodo. Verdade - claro - mas "informar" um rapaz de 13 ou 14 que ele não terá o periodo é chamar-lhe ignorante, pois não sejamos naives: com essa idade já muito sabem, quer eles quer elas, sobre as questões da sexualidade e portanto não nos podemos apresentar como se eles fossem uma nulidade na matéria, o que levaria unicamente ao escárneo por parte dos adolescentes, como em qualquer momento de educação temos de saber ser humildes enquanto formadores.

Numa segunda parte (muito mais caricata) era apresentado um... chamemos-lhe manual técnico... onde se "ensinava" aos debutantes lições tais como: "Como dar um beijo de língua" não esquecendo obviamente "Como fazer amor" nestas secções aprende-se que os ingleses não gostam de "beijos molhados" e que não se deve rodopiar demasiado a lingua dentro da boca de alguém (infelizmente não indicavam as rpm máximas) e acima de tudo aprende-se como fazer amor ou seja: posição do missionário, eventualmente a única permitida pela ASAE.

Como não poderia deixar de ser, havendo um bom editor, o expoente máximo do livro ficava na na terceira e ultima parte do livro, dedicado inteiramente às perigosas dúvidas que os pupilos pudessem ter... E nela se apresentava o supra sumo das ignorantes frases , atentemos:

"É normal alguns rapazes sentirem atracção por outros rapazes, isso altera-se com a idade"

Como quem me conhece pessoalmente decerto perceberá esta acima de qualquer outra afirmação chocou-me profundamente! Desde cedo me sei homossexual e já passei demasiado devido a isso para agora me dizerem que enfim é um azar que daqui a uns tempos passa.

Pois é, podem não acreditar mas era esta a referência à homossexualidade existente num livro de que se esperava ser clarificador e mais que isso estabilizador para os jovens, pois efectivamente a meu ver mais que bombardear as pequenas mentes com informação distorcida e endoutrinante há que os colocar à vontade com a sua sexualidade quantas vezes complexa e dificil de entender (Eu no 6º e 7º ano ia dando em doido).

Tudo isto além de mais uma vez me demonstrar o quão crua e ignorante a main stream da sociedade pode ser (por acaso não sei porque ainda me dou ao trabalho de contabilizar) relembrou-me que se pretende introduzir a obrigatoriedade da educação sexual nas escolas e assustou-me ao ver como tal pode ser tão mal direcionada e efectuado. Mas enfim o que vale é que nós ocidentais ficamos muito escandalizados com as crianças muçulmanas a decorar apenas e só o Al-Corão... nós somos muito diferentes para melhor. Não somos ?