
No topo de um dragoeiro, um rouxinol cantava à pomba dos seus olhos:
«Toda a minha canção é para ti,
com ela quebro o silêncio gélido das noites
com ela saúdo o brilho dos teus dias.
Noite e dia e dia e noite
Toda a minha canção é só para ti, Pomba.
Porque me trouxeste paz, e as palavras da minha voz,
Porque me fizeste ver a beleza de todas as coisas,
Porque enfrentaste tempestades na madrugada dura só para voares para mim,
Porque mostras compaixão quando as canções são desafinadas, tristes e irrequietas,
Porque nasceste para nos mostrar que uma pomba traz sempre paz, bondade e beleza a todos que a vejam voar livre.
Por isto tudo, Pomba, e por mais que possas imaginar,
A minha canção é tua, e só tua.
E hei-de aguentar-nos nas tempestades de madrugadas duras, e hei-de te proteger e coroar-te com flores de cerejeira e retribuir-te a bondade, mesmo que não nos compreendam.
Mas daqui não saio. E a ti, não te deixo.»
E a pomba cantou, respondendo ao rouxinol,
«E eu oiço a tua canção,
Quando a lua transforma o meu branco em prata,
Quando a luz do dia me coroa,
Dia e noite e noite e dia
Só oiço a tua canção.
Porque se a todos trago paz, em ti encontro a minha,
Porque me fizeste ver a vida de todas as coisas,
Porque quando vôo para ti, vôo livre, e sou feliz quando poiso,
Porque consigo ouvir para além das canções desafinadas e tristes, e ver horizontes de melodias alegres,
Por isto tudo, Rouxinol, e mais do que possas imaginar,
Apenas oiço a tua canção.
E hei-de a ouvir e sentar-me neste mesmo galho, sob o granizo e as mandíbulas do sol, cantando contigo,
venha o que vier.»
RSN