Há em todos nós, por mais modernos que queiramos ser, há lá oculto, dissimulado, mas não inteiramente morto, um beato, um fanático ou um jesuíta! Esse moribundo que se ergue dentro de nós é o inimigo, é o passado. É preciso enterrá-lo por uma vez, e com ele o espírito sinistro do Catolicismo de Trento.A natureza, em mim, é conservadora; só o espírito é revolucionário.O Hegelianismo foi o ponto de partida das minhas especulações filosóficas, e posso dizer que foi dentro dele que se deu a minha evolução intelectual.A grande revolução… só pode ser uma revolução moral, e essa não se faz de um dia para o outro nem se decreta nas espeluncas famosas das conspirações, e, sobretudo, não se prepara com publicações rancorosas de espírito estreitíssimo e ermas da menor ideia práctica.… Mais preciso pôr-me em comunhão com a alma colectiva.… Fui sempre amigo de me achar em minoria.… É preciso também chorar e amar aquilo mesmo que nos faz chorar.Vou percebendo que o pessimismo de [Karl Edward von, 1842 – 1906] Hartmann se parece singularmente como o meu optimismo… Talvez eu tenha inventado a Filosofia do Inconsciente sem o saber!… Choro – mas não me envergonho de chorar.Eu cá vou indo. Cada vez mais místico e penso que daria um sofrível monge, se não fossem estes nervos miseráveis, inimigos da paz de espírito. Querem alguns dizer que muitos santos foram histéricos e nevróticos. Não posso crê-lo. Este estado de nevrose é o menos favorável à serenidade interior e, por conseguinte, à santidade.Mas quem de amor nos lábios traz doçuraEsse é que leva a flor de uma alma pura!Só no meu coração, que sondo e meço,Não sei que voz, que eu mesmo desconheço,Em segredo protesta e afirma o Bem!E os que folgam na orgia ímpia e devassaAi! quantas vezes ao erguer a taça,Param, e estremecendo, empalidecem!Ausentes filhas do prazer: dizei-me!Vossos sonhos quais são, depois da orgia?Acaso nunca a imagem fugidiaDo que fostes, em vós se agita e freme?Um século irritado e truculentoChama à epilepsia pensamento,Verbo ao estampido de pelouro e obuz…Mas cruzar, com desdém, inertes braços,Mas passar, entre turbas, solitário,Isto é ser só, é ser abandonado!Assim a vida passa vagarosa:O presente, a aspirar sempre ao futuro:O futuro, uma sombra mentirosa.Antero de Quental
Montag, 28. September 2009
A natureza, em mim, é conservadora; só o espírito é revolucionário.
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11 Kommentare:
O meu conterrâneo Açoriano preferido...
Creio que acaba por ser verdade. Todos - até certos elementos de esquerda revolucionária ou revisionista desta comunidade - têm em si um embrião de conservadorismo, que a força das circunstâncias não permite senão abortar.
Note-se que Antero de Quental foi membro de um dos primeiros partidos de orientação Proudhónica e proto-marxista em Portugal. Não foi por isso que deixou de fazar brilhar na sua obra poética e filosófica sempre um temor religioso muito micaelense, muito açoriano, um misto de amor profundo a Deus e à "sagrada família", respeito, confiança e fé - por regra, relativamente emancipadas de uma dependência intelectual e religiosa ao Vaticano.
Antero de Quental foi um tipo religioso, conservador, sim - mas tinha bestunto e soube ver que numa sociedade atrasada que vivia um feudalismo capitalista semelhante ao que temos ainda hoje, a resposta a dar era o compromisso entre a vontade e as crenças do povo, sejam elas quais forem, e a modernidade de Esquerda da luta à opressão e exploração.
Não vejo como se possa censurar a orientação de Quental.
Aliás, há muita gente que se devia perguntar, por aí, se a sua natureza não será antes revolucionária, e o seu espírito breve conservador.
Filipe
Respondendo à questão que em último sugeres, diria que a frase foi bem por ele formulada.
A natureza individual, aponta-nos e indica-nos sempre caminhos sedutores por mais tortuosos e imbecis que nos apresentem, a natureza puxa-nos e guia-nos nessa viagem inútil.
Agora o espírito... Quem é que sabe domar o espírito? No decurso do caminho somos sempre atacados pelo espírito, ele pode ser oculto e breve nas suas manifestações, mas ofusca-nos sempre da linha que a natureza nos traçou e deixa-nos completamente perdidos. Exige de nós aquilo que a natureza não nos concedeu, força-nos com a sua necessidade, porque é ele o último reflexo da nossa alma por mais que esta esteja trabalhada pela nossa natureza. Se calhar falo de mim e não de Antero quando emito estas breves linhas, mas em mim, a natureza é conservadora; agora o espírito, esse génio maldito que amaldiçoo e abençoo, essa torrente de águas revoltas e límpidas em que incide a luz da minha alma, esse será sempre revolucionário no sentido geral do termo. E será ele que me irá dar a paz, quer me afogue nessas águas, quer nelas mate a sede.
E mesmo quando acho que me vou afogar, continuo sempre com a mesma sede... Será essa sede o espírito e não as águas que acuso? Não sei dizer, não sei avaliar. Estou vazio agora e a natureza retoma em mim o seu caminho, não há lâmina que me corte esta mão, nesta indefinição há muito que estou talhado ao milímetro.
E acho sempre que açoriano se escreve açoreano e isto antes da companhia de seguros. Mas pronto, para mim, dançar será sempre dansar, não sou o primeiro nem o último, sou apenas mais um.
Escrevo sem nexo, agora reparo, nem sei porque vomito estas palavras, a insónia permanece e nem revejo. As palavras saiem desconexas sem tempero nem tempera, assim me encontro, assim aguardo.
Não sei o que digo nem se digo alguma coisa, as rosas são ainda brancas e a sua luz queima-me por mais que me digam que não, que são serenas e belas.
As imagens fundem-se e o sono não chega, estou calmo agora, a natureza retoma-se em mim e o espírito adormece lentamente mais uma vez para se esconder atrás desta nova criação.
Não me compreendo nem compreendo, a bússola gira em torno de si própria e a terra é vermelha, mas as rosas são brancas. Gosto do azul mas não acredito nele, falam-me do vermelho, conheço o branco, sinto o azul e o azul tinge o meu vermelho porque o vermelho não conheço, só o branco.
A fotografia devassa-me o espírito, e a máscara tomou conta da natureza ou será que foi a natureza que se mascarou? Não penso, não reflicto, não sinto, não choro, não amo, não odeio, não durmo, escrevo sem parar e o dicionário repreende-me, o teclado tem saudades da caneta, e eu só tenho uma caneta, está na mala.
Procuro algo entre um piano e um violino, o piano é a minha natureza mas o violino é o meu espírito e eu estou no meio. As cordas estão ká, o som sai, mas o violino não toca e o piano apressa-se, a uma mão, a duas mãos, a quatro mãos e eu não sou virtuoso, o arco parou e os braços caíram mas os dedos continuam frenéticos no teclado, não conhecem as teclas porque só se lembram das cordas e em cada tecla esperam encontrar o corte da corda mas a tecla é pesada e soa antes de saber que a premi.
Assim me esqueço da música e recordo apenas o som. Um som que chove, que gotícula e perde a forma que o definia, os homens correm e não pensam e já não formam um colectivo, tornaram-se um a um em homens mas em homens que se tornaram já não o são antes ainda de o serem e agora não pensam, eu não penso, fogem, será que fujo?
Ousado estou, porque não estou, não sou e como tal é fácil ser o que se não é porque o que se é nunca chega a ser e eu nunca chego a ser o que sou porque aquilo que sou nunca é nem chega a ser porque não percebo estas palavras que se apropriam das minhas mãos, das mão que não quer ser ferida, que permanece incólume como nasceu e ela envelhece mas não muda, e dizem-me que é bela, bela porquê? Será o seu gesto ou a sua forma, talvez ambos, a lixívia tirou-me a cor mas o indigo suja-me as mãos brancas que procuram o sangue. Mas o sangue não corre e a tinta tarda em chegar, todos se maquiam.
E não páro, não consigo, escrevo, escrevo mas não digo nada. As palavras amontoam-se e os pensamentos não chegam a ser nada, esfumam-se antes que lhes permita formar, nascer, cristalizar, assentar. Nuvens de pó, será fumo? continuam e eu não consigo ver nada, os olhos estão secos, a pele está cansada. Vou fechar o livro.
Que quero dizer? Que quero afirmar? Será que quero o quer que seja? Não sei parar, o livro não fecha, a água inunda-me a casa e vomitei na casa de banho, limpei o que pude mas o cheiro enjoativo e bilioso possuí-me as narinas, controlo a náusea mas não percebo, olho-me com desdém e no espelho acho-me belo no meio desta putrefacção que me rodeia. Sublinho que nada digo, mas tudo escrevo, porque nada tenho para dizer nem sei se digo, mas não consigo parar, os dedos continuam na ponta dos braços inertes. Não sei fazer nada mas tudo faço e no fim nada fiz, não consigo parar porque o espírito encontrou a natureza e não falam a mesma lingua, usam um intérprete de Bruxelas que recebe dinheiro a mais mas não eprcebe nenhuma das línguas porque só fala português. Mas a natureza é surda e o espírito só sabe gritar e o intérprete é um idiota. Perdeu-se mas continua, e sem saber o que traduz, inventa, ou melhor, aldraba, engana e burla nem sabe bem o quê até porque não se lembra, perdeu a memória e deixou de ficar triste embora não tenha ficado muito contente porque palavra atrás de palavra a todas anulou porque não sabe nada. É um idiota.
São 3:33, não 3:34 agora é feio, o três é bonito, parece um infinito incompleto mas agora já passou e já são 3:34. Tenho aula de Quântica às 11, é melhor tentar dormir porque acordo cedo. Minto, não vou acordar cedo mas tenho aula, vou lá mas vou ficar de fora mesmo que me vejam porque me vêem sempre mas nunca me tocam. E eu também não toco, tenho nojo e uso sempre luvas.
Olha que fofinho, transformei um substantivo em verbo.
Encontrei uma ave de fogo e estou a sagrar a minha Primavera, no penúltimo dia saberei mais, recupero-me lentamente, a realidade desenha-se aos poucos e recordo-me de mim, agora compreendo o jogo de cartas mas continuo sem saber jogar, jogo sempre ao acaso mas acham que jogo bem e muito. Agora sim, tenho sono e já vejo novamente pelos pesados olhos, são 3:47 e não paro. Um 3 desdobrado devia ser inifnito mas afinal dá 8 e eu nunca soube fazer contas. Pronto, assim sou nestas horas.
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