Sonntag, 11. September 2011

Notas soltas


A mais nobre força do ser humano é a razão. A mais alta meta da razão é o conhecimento de Deus.

Santo Alberto Magno, ca. 1200-1280 (sábio universal, dominicano)



Entre Deus e a ciência natural não encontramos qualquer contradição. Eles não se excluem, como hoje alguns crêem e temem; eles completam-se e implicam-se mutuamente.


Max Planck, 1858-1947 (Nobel da Física: fundador da teoria Quântica)

Dixit.

Montag, 29. August 2011

Tempos de Crise: Pessoa Revisitado

Prece

"Senhor, a noite veio e a alma é vil.

Tanta foi a tormenta e a vontade!

Restam-nos hoje, no silêncio hostil,

O mar universal e a saudade.


Mas a chama, que a vida em nós criou,

Se ainda há vida ainda não é finda.

O frio morto em cinzas a ocultou:

A mão do vento pode ergue-la ainda.


Dá o sopro, a aragem, – ou desgraça ou ânsia -

Com que a chama do esforço se remoça,

E outra vez conquistemos a Distância -

Do mar ou outra, mas que seja nossa!"


Mittwoch, 3. August 2011

Ensinamento, n.º 2

O capitalismo é a arquitectura moderna da escravatura. E daqui a uns anos também será abolido.

Agosto!

Sei os teus seios.
Sei-os de cor.

Para a frente, para cima,
Despontam, alegres, os teus seios.

Vitoriosos já,
Mas não ainda triunfais.

Quem comparou os seios que são teus
(Banal imagem) a colinas!

Com donaire avançam os teus seios,
Ó minha embarcação!

Porque não há
Padarias que em vez de pão nos dêem seios
Logo p'la manhã?

Quantas vezes
Interrogastes, ao espelho, os seios?

Tão tolos os teus seios! Toda a noite
Com inveja um do outro, toda a santa
Noite!

Quantos seios ficaram por amar?

Seios pasmados, seios lorpas, seios
Como barrigas de glutões!

Seios decrépitos e no entanto belos
Como o que já viveu e fez viver!

Seios inacessíveis e tão altos
Como um orgulho que há-de rebentar
Em deseperadas, quarentonas lágrimas...

Seios fortes como os da Liberdade
-Delacroix-guiando o Povo.

Seios que vão à escola p'ra de lá saírem
Direitinhos p'ra casa...

Seios que deram o bom leite da vida
A vorazes filhos alheios!

Diz-se rijo dum seio que, vencido,
Acaba por vencer...

O amor excessivo dum poeta:
"E hei-de mandar fazer um almanaque
da pele encadernado do teu seio"

Retirar-me para uns seios que me esperam
Há tantos anos, fielmente, na província!

Arrulho de pequenos seios
No peitoril de uma janela
Aberta sobre a vida.

Botas, botirrafas
Pisando tudo, até os seios
Em que o amor se exalta e robustece!

Seios adivinhados, entrevistos,
Jamais possuídos, sempre desejados!

"Oculta, pois, oculta esses objectos
Altares onde fazem sacrifícios
Quantos os vêem com olhos indiscretos"

Raimundo Lúlio, a mulher casada
Que cortejastes, que perseguistes
Até entrares, a cavalo, p'la igreja
Onde fora rezar,
Mudou-te a vida quando te mostrou
("É isto que amas?")
De repente a podridão do seio.

Raparigas dos limões a oferecerem
Fruta mais atrevida: inesperados seios...

Uma roda de velhos seios despeitados,
Rabujando,
A pretexto de chá...

Engolfo-me num seio até perder
Memória de quem sou...

Quantos seios devorou a guerra, quantos,
Depressa ou devagar, roubou à vida,
À alegria, ao amor e às gulosas
Bocas dos miúdos!

Pouso a cabeça no teu seio
E nenhum desejo me estremece a carne.

Vejo os teus seios, absortos
Sobre um pequeno ser

---

Alexandre O'Neill

Samstag, 11. Juni 2011

Eine Einladung für Europäer


Liebe Alumni des Europa-Kollegs,
Meine lieben Freunde,
ich möchte euch zu einer Auseinandersetzung einladen, die ein Thema betrifft, das mich sehr interessiert. Die meisten von euch wissen, dass ich Jura studiere, vielleicht aber nicht dass ich mich in der Zukunft mit EU-Recht beschäftigen möchte. Ich bin ein überzeugter Europäer und Föderalist. Ich gehöre noch zu einer Lebensart, die langsam ausstirbt: Die Lebensart, die an den sog. ,,Europäischen Traum" glaubt und ihn am Leben behalten will.

Ihr wisst alle, dass die EU eine Krise erlebt; eine Krise, die manche Alumni besonders direkt betrifft und ihr tagtägliches Leben stark beeinflusst. Portugal und Griechenland, zum Beispiel, werden jetzt harte Zeiten leiden, und es sieht so aus, dass auch Spanien zum nächsten Opfer der Märkte wird. Die Arbeitslosigkeit steigt, der Sozialstaat wird abgebaut, die Armut wachst, mehr Steuer werden gezahlt, und die Zukunft nicht nur von Ländern, sondern auch von Individuen aus diesen EU-Staaten wird zunehmend unsicher. Als Jura-Student kann ich euch sagen, dass das wahrscheinlichste ist, dass ich nach meinen Studien entweder jahrenlang warten werden muss, um hoffentlich ein Job zu bekommen, oder sofort in eine Anwaltsfirma angenommen werde, wo ich - jetzt ohne überhaupt nicht zu übertreiben - 12-14 oder 16 Stunden am Tag, 6 Tage die Woche, zumindest 2 Jahren lang als Praktikant arbeiten müssen werde, und zwar ohne Lohn. Wenn ich überhaupt das Glück habe, ein Job zu finden, in dem ich bezahlt werde, dann werde ich höchstwahrscheinlich nicht mehr als 1000€ im Monat bekommen. Wenn ich Glück habe. Denn vielen meiner (europäischen) Mitbürger sind solche tolle Möglichkeiten ausgeschlossen.

Als ob das nicht genug wäre, scheint die EU in den letzten Zeiten, ihre eigene Werte und Prinzipien zu verraten. Wir schliessen unsere Türen Kriegsflüchtlingen zu, die sonst in Lybien nach *ausdrücklichen* Befehlen eines psychopatischen Diktators wahrscheinlich vergewaltigt und vernichtet würden.
(
"Die Union lässt sich bei ihrem Handeln auf internationaler Ebene von den Grundsätzen leiten, die für ihre eigene Entstehung, Entwicklung und Erweiterung maßgebend waren und denen sie auch weltweit zu stärkerer Geltung verhelfen will: Demokratie, Rechtsstaatlichkeit, die universelle Gültigkeit und Unteilbarkeit der Menschenrechte und Grundfreiheiten, die Achtung der Menschenwürde, der Grundsatz der Gleichheit und der Grundsatz der Solidarität sowie die Achtung der Grundsätze der Charta der Vereinten Nationen und des Völkerrechts." - Artikel 21 (1) VUE)



Auch die Schengen-Zone wird betroffen und unsere Grenzen schliessen sich wieder gegenseitig, welches auch nicht ganz der EU-Idee entspricht... Misstrauen wachst unter Regierungen und Mitgliedstaaten, einige werden zum Sündenbock der wirtschaftlichen Krise; andere lügen andere Mitgliegstaaten über ihre schwache Finanzen an; andere - wie Portugal - haben unverantwortlich gehandelt, indem sie hartnäckig Monaten lang sich geweigert haben, die EU um Hilfe zu bitte
n, welches grosse wirtschaftliche Gefahren entstehen liess. (Nach dem Grundsatz der loyalen Zusammenarbeit achten und unterstützen sich die Union und die Mitgliedstaaten gegenseitig bei der Erfüllung der Aufgaben, die sich aus den Verträgen ergeben. (...) Die Mitgliedstaaten unterstützen die Union bei der Erfüllung ihrer Aufgabe und unterlassen alle Maßnahmen, die die Verwirklichung der Ziele der Union gefährden könnten. - artikel 4 (1) und (3) VUE)

In einer Zeit wie dieser kann eine Auseinandersetzung wie die, die ich euch vorschlage, oberflächlich klingen. Doch bin ich überzeugt, dass sie - vor allem JETZT - wichtig ist, genau WEIL wir in Europa wirtschaftliche und politische Schwierigkeiten leiden, die fähig sind, uns zu trennen und gegenseitiges zerstörendes Misstrauen zwischen unseren Ländern zu erzeugen.

Die Frage ist also:
Können wir von einer gemeinsamen europäischen Identität sprechen? Was verbindet uns von einem kulturellen Gesichtspunkt, anstatt uns zu trennen?

Ich wäre euch sehr dankbar, wenn ihr an dieser Debatte teilnehmen und eure Meinung dazu geben würdet. In einer Zeit, in der der EU-Begriff in Frage gestellt wird, brauchen wir zu hören, dass es noch andere gibt, die Hoffnung für die wahre Europäische Union noch behalten und glauben, es gibt mehr als Wirtschaft und Politik, das uns als Europäer zusammenbringt.

Vielen Dank!

Euer Filipe, EK 2007

Mittwoch, 25. Mai 2011

«Eu cá sou de opinião que não cabe aos juízes, ao tempo civil e ao templo civil, à República, encorajar a poesia (...) Só cabe ao Deus que morreu.»

Herberto Hélder

Freitag, 29. April 2011

O Hospital


José P. saiu tarde do emprego, numa noite como esta.
À porta da empresa, tropeçou num grupo de mendigos cadavéricos deitados. Através dos seus olhos transparentes via-se a putrefacção de sonhos ingénuos acumulados ao longo de vidas que se arruinaram num abrir e fechar de olhos. Pediram-lhe dinheiro, por favor, algo para comer, por bondade; mas José P. não tinha nada.
Desceu as escadas imundas e entrou na estação inundada de massas disformes de mártires anónimos. Nas caras empalidecidas via-lhes o desespero; o seu silêncio plúmbeo tresandava a medo do futuro.
Foi aí que lhe ocorreu pela primeira vez que os túneis do metro, nos dias que correm, não são senão os esgotos ocultos das sociedades decadentes. Todo o pus segregado pela injustiça flui nos canais ininterruptamente: os incontáveis cansados, explorados, desempregados, cegos, imigrantes, estudantes esquecidos sonhando com a emigração, pequenos e médios empresários falidos, estagiários sem nome nem futuro, idosas solitárias que se alimentam de pouco mais que a amargura da velhice miserável, advogados agrilhoados em torres de intermináveis processos de insolvência.
Saiu e apanhou o autocarro para a sua cidade-dormitório, o império da insónia dos desempregados e dos pequenos comerciantes - que contam em angústia os segundos que faltam para perderem o subsídio ou para dívidas invencíveis vencerem. No caminho, pensou que como a noite estava escura e o Município tem dinheiro para criar para primos e camaradas de partido empresas que nascem deficitárias e inúteis, mas não para assegurar uma iluminação suficiente nas ruas, talvez ainda fosse assaltado e devia era andar depressa para chegar a casa.
Mas depois lembrou-se que não tinha dinheiro. Nem mesmo anel de noivado, que tinha entregue com grande relutância a um daqueles homens muito honestos que se vê por aí cada vez mais, daqueles que compram o ouro a pessoas quase falidas ao preço da chuva.
José P. lembrou-se que não tinha nada na vida, nunca teve, e nunca teria; e viu que lhe era completamente indiferente se era assaltado ou não. Mesmo que fosse, não tinha vontade de voltar a ir à esquadra e rogar insistentemente a mais um chui gordo, imbecil e imprestável o favor de lhe dar os tais impressos para não-sei-quê para os preencher antes que fossem definitivamente perdidos nos abismos da Administração Pública e da Justiça portuguesas sem que ninguém se voltasse a chatear com o assalto: nem o chui indiferente e inerte, nem o ladrão que dorme descansado na segurança da sua impunidade certa, nem os funcionários públicos bafientos ausentes na sua permanente indignação por os seus privilégios deixarem de ser tabu, nem o juiz frustrado com a desorganização patológica do sistema judicial que suspira de desgosto quando tem a certeza absoluta que acabou de ouvir ratazanas a fornicar dentro de um dos muitos buracos encharcados nas paredes da sala de audiências.
Das janelas do autocarro ainda passou pela parte rica da cidade, por breves momentos. E José P. conseguiu ver altos muros armados com alarmes protegendo vivendas de intocáveis de fato e gravata, intocáveis que se alimentam de jantares de negócios, que levam os filhos para o colégio de BMW e Jipe até à idade em que estes já podem conduzir o seu próprio BMW e Jipe para a Universidade privada. Também eles vivem com medo de serem roubados, mas não do desemprego ou da pobreza: afinal, conhecem um gajo, pá, que conhece outro gajo, pá.
Chegou à casa vazia e abriu a caixa do correio.
Viu que tinha chegado mais uma remessa de cartas do banco, de velhos amigos que tinham emprestado algum dinheiro em alturas difíceis e agora pediam amavelmente o dinheiro de volta, visto estarem eles próprios a apertar tanto o cinto que em breve estariam cortados em dois. Havia também inúmeras cartas das telecomunicações, da água e do gás e da electricidade, que exigiam mais e mais e mais ainda; afinal, podiam fazê-lo impunemente, como monopolistas ou oligopolistas, longe de um mercado livre guardado por Autoridades da Concorrência activas.
José Pedro suspirou, sentiu uma dor de cabeça profunda.
Como ia pagar aquilo tudo? Era impossível, agora que tinha voltado pela última vez a casa vindo da empresa. Lembraram-lhe que aquilo que ele tinha não era bem um contrato e que podiam fazer com ele o que quisesse.

De repente, a dor ficou ainda pior. Lembrou-se que para a semana tinha de pagar os impostos. Talvez se o banco lhe pudesse emprestar dinheiro? Mas agora já não emprestam dinheiro a ninguém para nada, ao passo que antigamente emprestavam a todos para tudo. Tirou a mão do bolso e saiu o talão do supermercado. Pegou nele antes de o pôr no lixo e, subitamente, desatou a chorar descontroladamente. Chorou como uma criança abandonada. O IVA já estava a 25% e ia de certeza subir de novo. E sabia que deles não sairia nada para o subsídio de desemprego agora até arranjar outro trabalho, ou para a reforma: ia, sim, para bónus de gestores públicos na casa dos 30-40 evidentemente inaptos para mais do que ir falar de bola e para almoços da sua Juventude partidária; aquele IVA ia, sim, para as indemnizações compensatórias de empresas públicas que são nados-mortos ou mortos-vivos económicos.

José P. não aguentava mais. Todos lhe exigem tudo o que tem e os seus filhos haveriam de ter, mas ele não pode sequer pedir impressos para não-sei-quê com a mais inocente facilidade.
Atirou-se do seu 5.º andar e caiu sobre a rotunda.
Os vizinhos, em alvoroço, chamaram a ambulância para levar o pobre Sr. P. ao Hospital.
Lá veio a ambulância, passados 20 minutos, que logo arrancou e levou José P., moribundo.

A viatura parou à porta do Hospital. Os enfermeiros coçaram a cabeça quando perceberam o que se passava e tentaram acordar José P.. Explicaram-lhe que pediam muita desculpa, mas que tinha havido um mal-entendido e que o tinham levado para o Hospital do Município, ignorando que as obras da sua construção ainda nem sequer tinham terminado. E ainda por cima, acabavam de reparar que se tinham esquecido de encher o depósito com gasolina.
Agora já era tarde demais. José P. ia mesmo morrer ali. Consta que as suas últimas palavras foram:
«Mas... então isto é assim? Eu a morrer e vocês nem têm o cuidado para ver se o Hospital está a funcionar? Mas não conseguem fazer o vosso trabalho?»
Ao que o enfermeiro respondeu, como qualquer português o teria feito:
«Isso das informações é lá com a central. Não é a minha área. Mas se quiser, dou-lhe o endereço do meu superior hierárquico para enviar uma carta a queixar-se. Só não garanto que algum dia alguém a leia.»





F. B. B.

Samstag, 23. April 2011

O Instituto


Ainda envolto e matinal, vestiu-se mecânica e agilmente entre a cálida Primavera dos raios que chegavam pela fresca janela. O Sol nascia... E enjoado pelo entusiasmo da insónia, cansado pela noite, mas animado pelo dia, saíra da cama e esvoaçava pela ligeira neblina até à estação.

Era o primeiro dia de uma nova etapa, ou pelo menos, assim o via. Entre o bulício do pequeno terminal entrava no comboio. Outros como ele se dirigiam hoje para a capital. Num deserto de caras conhecidas, não reconheceu ninguém e sentou-se numa cadeira sozinha ao pé da janela. Entre os carris, ruídos e fumos deixava a sua terra natal, a sua família e um conjunto de poemas bem conhecidos para dar o primeiro passo em direcção à sua independência e vida adulta.

Sem saber ao certo o que o esperava, de mãos abertas e sem qualquer tipo de expectativa boa ou má, deixava na mala o seu passado e procurava agarrar como louco fugitivo sedento de liberdade, a incerteza desse futuro que tanto temia mas pelo qual tanto ansiava. O comboio partia. Comboio do inconsciente, onde depositava todas as suas esperanças, sobretudo de encontrar algo completamente diferente e distinto dos bucólicos campos e das vastas planícies que hoje abandonava na janela da carruagem.

Já aninhado no calor da carruagem, distraído e sonolento, ignorava os conterrâneos e deixava lentamente embalar-se pelo metrónomo da velha linha... assistindo desligado às verdes planícies salpicadas de sobreiros e aldeias distantes que entre os caminhos e riachos, velhas estradas e pontes, lhe corriam pelos olhos da janela embaciada.

E neste sono acordado fluíam-lhe as águas apressadas de um inquieto e fresco riacho primaveril onde corriam todas as escolhas e eventos, todas as encruzilhadas que o tinham trazido até ao dia presente. E nas faces desses fios de água rápidos e transparentes, incisivos reflexos desse Sol que não conseguia encarar encandeavam-no, ferindo-lhe os olhos claros. Rapidamente desviava o olhar e o pensamento acordando, mas deixava novamente o sonho seguir em frente, ignorando todos os condicionamentos, medos e manias que corriam nessa cortina de água, reflexos e luz que impossibilitado de agarrar ou fixar na sua mente, agora desagoava na foz desta nova era... Pim! A carruagem engasga-se e arrancado desse fluxo, subitamente acorda. O comboio chegara.

Animado pela adrenalina do sobressalto, sai rapidamente do comboio e ignorando as multidões, atravessa a estação parecendo invisível à confusão matinal na grande cidade. Familiar às velhas ruas, deambulava até ao seu objectivo ainda perdido nos labirintos do sonho que tivera.

Mas sim, queria virar a página! Em boa verdade, nem faria sentido de outra forma. Queria acima de tudo esquecer esse passado e abraçar com esperança renovada o futuro que se aproximava inquieto, o que só era possível no gentil embalo da ingénua ignorância de si mesmo, correndo sempre para os seus longos braços depois dos breves momentos de consciência que o assolavam, esquecendo-se por completo do que fora, do que era... Sempre nessa ilusão, na esperança daquilo que virá...

E foi em passo apressado, num misto de optimismo e distracção que caminhou pelas velhas ruas do antigo regime, e lhe afloravam algumas destas emoções e pensamentos, enquanto revia mentalmente todo o jogo burocrático envolvido no misterioso processo de inscrição.

No entanto, e à medida em que resolvia mentalmente estas preocupações prácticas, por maior que fosse o esforço para esse conveniente esquecimento, o prisioneiro sedento e afogueado temia em todas as ruelas e esquinas desta nova vida, a velha polícia do passado ou a denúncia anónima de uma qualquer memória há muito esquecida.

E foi neste inquieto estado de alma que subiu a velha colina e depois a escadaria até aos ferrugentos portões do Instituto.

André Cunha

Freitag, 22. April 2011

Santa Páscoa

Ascensão de Cristo
Salvador Dali

Freitag, 1. April 2011

"Entre o céu e o mar"

Entre o céu e o mar
Paulo Nozolino
Lagos, 1979 | Platinotipia | 33,5 cm x 50 cm
Obra da Colecção do Centro de Artes Visuais – Encontros de Fotografia

Samstag, 26. März 2011

Ode à Alegria


Freude, schöner Götterfunken,
Tochter aus Elysium,
Wir betreten feuertrunken,
Himmlische, dein Heiligthum!
Deine Zauber binden wieder
Was der Mode Schwert geteilt;
Alle Menschen werden Brüder,
Wo dein sanfter Flügel weilt.

Friedrich Schiller



Alegria, mais belo fulgor divino,
Filha de Elíseo,
Ébrios de fogo entramos

Em teu santuário, celeste!

Teus encantos unem novamente

O que a espada sempre separou.

Todos os homens se irmanam

Onde pairarem as tuas asas suaves.


Dienstag, 22. März 2011

Ciência, Ciência, Ciência

A CIÊNCIA, a ciência, a ciência...
Ah, como tudo é nulo e vão!
A pobreza da inteligência
Ante a riqueza da emoção!

Aquela mulher que trabalha
Como uma santa em sacrifício,
Com tanto esforço dado a ralha!
Contra o pensar, que é o meu vício!

A ciência! Como é pobre e nada!
Rico é o que alma dá e tem.


F. Pessoa

Samstag, 19. März 2011

Newton


Newton, retratado por William Blake como grande arquitecto do universo

Sonntag, 13. März 2011

"Cruelty has a human heart..."


Cruelty has a human heart,
And Jealousy a human face;
Terror the human form divine,
And secrecy the human dress.

The human dress is forged iron,
The human form a fiery forge,
The human face a furnace seal'd,
The human heart its hungry gorge.


William Blake

Mittwoch, 9. März 2011

"Memento homo, quia pulvis es, et in pulverem reverteri"


Hoje, a Igreja despe-se do verde; veste-se da cor litúrgica Roxa.


Veste-se para que nos lembremos do Tempo que agora começa. É o Tempo, por excelência, da oração, do jejum, da esmola; de olharmos para nós, para a nossa relação com Deus e para a nossa relação com os outros. É o Tempo em que somos convidados a aprender e aprofundar a beleza e a riqueza da caridade, da relação fraterna, da partilha, da doação e do amor concreto.

Inicia-se o Tempo de preparação para a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo. O Mistério Pascal de Cristo deve ser o nosso mistério: «morremos para o homem velho e ressuscitamos para o homem novo» (Rom 6, 1-11)

Sobre a testa dos cristãos, hoje, estará marcada uma cruz de cinzas, de pó. Ela é símbolo da vontade de mudança de vida e, principalmente, de Conversão interior; que não é, com efeito, nada mais que um voltar os olhos para Deus; numa atitude pronta para O seguir, sempre.

Simboliza, por outro lado, que somos pó, e que ao pó haveremos de voltar. Sejamos crentes ou não, esta é uma realidade que ninguém pode transpor. A condição humana é perecível e transitória neste Mundo; porém a Vida, essa: é solidificada pela Alma que permanece.

Homens mortais, homens imortais, se todos os dias podemos morrer, se cada dia nos imos chegando mais à morte, e ela a nós, não se acabe com este dia a memória da morte.

Resolução, resolução uma vez, que sem resolução nada se faz.

E para que esta resolução dure e não seja como outras, tomemos cada dia uma hora em que cuidemos bem naquela hora.
De vinte e quatro horas que tem o dia, por que se não dará uma hora à triste alma?

Disse: Agora começo (Sl 76,11). Esta é a melhor devoção e mais útil penitência, e mais agradável a Deus, que podeis fazer nesta quaresma.
Tomar uma hora cada dia, em que só com Deus e connosco cuidemos na nossa morte e na nossa vida.

E porque espero da vossa piedade e do vosso juízo que aceitareis este bom conselho, quero acabar deixando-vos quatro pontos de consideração para os quatro quartos desta hora.
Primeiro: quanto tenho vivido?
Segundo: como vivi?
Terceiro: quanto posso viver?
Quarto: como é bem que viva?

Torno a dizer para que vos fique na memória: Quanto tenho vivido? Como vivi? Quanto posso viver? Como é bem que viva?

Memento homo!

Pe. António Vieira, Roma
na Igreja de S. António dos Portugueses, Ano de 1670.

Dienstag, 1. März 2011

Does it ring the bell?



«D. Carlos (...) chamou então à chefia do governo José Dias Ferreira, "o Zarolho". (...) era um jurista famoso, lente de Coimbra e advogado de sucesso. Homem rico, graças também ao foro, foi um importante franco-maçon. Diziam-no jacobino, identificando-o com o setembrismo de esquerda. Na verdade, fora Oliveira Martins quem o empurrara para o lugar, pondo como condição, perante o Rei, a nomeação de Dias Ferreira para a chefia do Gabinete, para a sua aceitação do ministério das Finanças. O Autor de Portugal Contemporâneo apresentou um drástico programa de reformas para salvar a situação financeira: redução dos vencimentos dos funcionários públicos, aumento das contribuições industrial, predial, pessoal e sumptuária e agravamento da taxa dos rendimentos e juros de acções e obrigações. (...) Mas a situação não melhorou. Os titulares estrangeiros da dívida portuguesa pediram garantias de controlo directo de algumas receitas. Homem de carácter e inteligência superiores, Oliveira Martins enredava-se mal na política prática e dava-se pior com a intriga e a manobra, sempre necessárias nestes cargos. E não resistiu quando "o Zarolho" o curto-circuitou em matérias da sua competência. Em 28 de Maio de 1892, saiu, não muito feliz com a experiência: "emergi da cloaca ministerial" - confidenciou numa carta.»

in Jaime Nogueira Pinto, Nobre Povo, os anos da República.

Montag, 21. Februar 2011

A Caverna


Todas as coisas são uma ilusão,
Pálidas e pétreas sombras de verdade,
Reflexos que dançam grotescamente
Pelas grutas vãs da nossa ignorância;
Pelas profundezas da ingenuidade.

Todas as coisas têm fugazes sombras:
Gémeas falsas - e idênticas, porém;
Cópias iguais - e por isso imperfeitas:
Pois tudo no mundo é sombra e tem sombra;
Cópia de engano é engano também.

FBB

Samstag, 19. Februar 2011

Cultura acessível a todos


O mundo que é a Internet está cada vez mais completo. Agora com o "Art Project", (um projecto da Google) qualquer pessoa, esteja ela onde estiver, tem a possibilidade de aceder às grandes Galerias de Arte do Mundo, com detalhes impressionantes e de forma gratuita.
Como poderão ver neste vídeo a ferramenta que nos permite "descobrir os mestres" é muito simples.

O nosso grande agradecimento e elogio às pessoas que trabalharam nesta extraordinária criação, que de alguma forma se tornou Obra de Arte, também. Nada substitui os originais, mas ainda assim: Que passo enorme na democratização do Conhecimento e da Cultura!

Um Bem Haja e Boas Visitas.

Figure de la Magnificence royale, de l'Immortalité et du Progrès dans les Beaux-Arts

1683

René Antoine Houasse

(Link com info e pormenor)

Do Mito e da História


Meus amigos,

ultimamente tenho reflectido sobre algo que uma vez ouvi sobre a origem do nome do nosso país, "Portugal" e sobre um mito em torno do selo real usado por D. Afonso Henriques. Foi aposto em documentos tão importantes como o da doação de Tomar à Ordem dos Templários.

De acordo com a teoria mais pacífica, o nome "Portugal" deriva da conjunção dos nomes antigos do Porto e de Gaia (Portus e Cale).

De acordo com uma curiosa teoria (que roça as teorias da conspiração dan-brown-escas), a escolha do nome para o reino estará ligada ao rumor medieval difundido na Península Ibérica da Reconquista de que o Santo Graal teria sido trazido para o seu Sul, para a região que então era conhecida por Al-Andalus, e lá estaria escondido.

Reparem bem no selo. "Rei Afonso"; "Com seus filhos"; e no centro, dependendo da ordem com que se ler as letras, o resultado tanto pode ser "Portugal" como "POR TU GRAL". O pequeno olho no centro tanto pode ser um "o" como apenas decorativo. Neste segundo caso, o "R" maiúsculo que surge em baixo parece estar um pouco fora do sítio.
Dada a devoção conhecida de D. Afonso I, o selo chegou a levantar dúvidas (e para alguns teóricos da conspiração, ainda levanta) sobre se o Reino se baseava nas cidades de Porto e Gaia (que, curiosamente, tinham pouca importância em comparação com, por exemplo, Coimbra, Guimarães e Lamego...) ou se o Reino se basearia na busca da Cristandade pelo paradeiro do Santo Graal.

Da minha parte, penso que é uma lenda bonita. Também temos direito a preservar este tipo de mitos improváveis e loucos; não acreditaram os Ingleses loucamente que Jesus teria visitado a sua terra, tanto que Blake dedicou a esse acontecimento um poema, "Jerusalem", que ainda hoje é considerado como o hino não oficial de Inglaterra? Não acreditaram os franceses que Joana D'Arc teria mesmo tido contacto com Arcanjo Miguel?

São loucuras destas que fazem de nós um povo; tradições e mistérios que fazem de nós uma cultura antiga; lendas que de nós fazem uma nação.

Donnerstag, 17. Februar 2011

Dienstag, 15. Februar 2011

O porvir de Portugal

Caro Ars Vitae,
Não podia deixar de partilhar conTigo este desabafo do Sr. Prof. Mendo Henriques:

Os cenários de transição na democracia portuguesa são:

Cenário 1. Continuidade da 3ª República , "o como está" com as reformas possíveis "gota a gota" permitidas pelos acordos entre partidos

Cenário 2. Uma 4ª República com um poder reforçado que é o do Presidente Executivo, o que exige dois partidos ou uma aliança presidencial, à norte americana, ou à francesa e nova triagem da luta partidária

Cenário 3. Uma 5ª Dinastia com um árbitro que é o rei, Dom Duarte de Bragança, com uma redistribuição de funções pelos três poderes e consequente selecção de minorias
para governação e para representação de interesses.

Cumprimentos saudosos,
de alguém que se preocupa com o estado da Nação e sente que há algo nela que requer mudança,
Hélder

Samstag, 5. Februar 2011

Mitologia judaico-cristã e greco-romana.




«O Senhor viu o quanto havia crescido a maldade dos homens na terra e como todos os projectos de seus corações tendiam unicamente para o mal. Então o Senhor arrependeu-se de ter feito o homem na terra e ficou com o coração magoado. E o Senhor disse: "vou extreminar da face da terra o homem que criei e com ele os animais, os répteis e até as aves do céu, pois estou arrependido de tê-los feito". (...) durante 40 dias o dilúvio se abateu durante a terra. As águas cresceram e ergueran a arca, que se elevou acima da terra. As águas tornaram-se violentas e aumentaram muito sobre a terra de modo que a arca começou a flutuar na superfície das águas. As águas cresceram tanto sobre a terra que cobriram as montanhas mais altas que estão debaixo do céu. (...) Pereceram todas as criaturas que se moviam na terra, tanto aves, como animais domésticos, como animais selvagens, enfim todos os seres que fervilham sobre a terra, e todos os homens.» (GEN., 6-7)



«Após a geração de prata [do Homem, que teve na mitologia greco-romana quatro eras, correspondentes ao seu valor e bondade: a geração de ouro inocente, de prata, menos valiosa, e...] seguiu-se a terceira, a de bronze, de índole mais feroz, mais pronta para as horrendas armas, mais ainda não criminosa. Esta última é a do duro ferro. De súbito, todo o acto nefando irrompe nesta idade de metal menos valioso. Fugiram o pudor, a sinceridade, a lealdade, e no lugar destes, sucederam-se-lhes o logro, a traição, e as insídias, e a violência, e a criminosa paixão por possuir. (...) Já nem apenas as searas e os alimentos devidos se exigiam ao rico solo, mas descem pelas entranhas da terra abaixo, desatam a escavar riquezas que aquela ocultara e movera para junto das sombras do Estígio, estímulos para o mal. Já o pernicioso ferro de lá surgira, e o ouro, mais pernicioso que o ferro. E surge a guera, que luta recorrendo a ambos, e, com mão ensanguentada, brande as estrepitosas armas. Vive-se na rapina. O hóspede não está a salvo do hospedeiro, nem o sogro do genro: até a afeição entre irmãos é rara. O homem maquina a morte da esposa, e esta a do marido. As aterradoras madrastas misturam amarelentos venenos. O filho, antes do tempo, inquire sobre a idade do pai (...)
Então Júpiter quebrou de novo o silêncio [na Assembleia dos Deuses] com tais dizeres: (...) "A má reputação desta época chegara-me aos ouvidos. Desejando que fosse falsa, deslizo do píncaro do Olimpo e percorro as terras, deus sob uma aparência humana. Longo seria enumerar quantas malfeitorias eu descobri por toda a parte: a verdade era pior que a má reputação. (...) Julgá-los-ias conjurados para o crime: todos devem sofrer, quanto antes, o castigo que merecem. É a minha sentença." (...) Este convoca os rios. Depois de eles entrarem no palácio do seu rei, diz: "não temos tempo a perder com longas exortações. Derramai as vossas forças, abri as vossas mansões e, removidas todas as represas, lançai à rédea solta as vossas torrentes cá para fora" (...) Os rios transbordam e desabam nas planícies abertas, e arrastam colheitas e árvores, animais e gentes (...) Já o mar e a terra não ofereciam qualquer distinção: tudo não era mais que mar, mar a que faltavam costas (...) Sob as águas, as Nereides vêem pasmadas bosques, cidades, casas; golfinhos ocupam florestas e chocam contra altas ramagens, embatem e abanam os carvalhos. Nada o lobo entre as ovelhas, a onda leva fulvos leões, tigres leva a onda; de nada vale a força das fulminantes presas ao javali, ou velozes pernas ao cervo arrastado. E, após longamente procurar terra onde pudesse pousar, a ave vagueante vai no mar com as asas exaustas. O desatino desmesurado do mar sepultara montanhas, e vagas inéditas embatiam nos píncaros das serranias.»
(Ovídio, Metamorfoses, Livro I, versos 125-312)

Gostava apenas de salientar um pormenor que acho muito interessante. Apesar da semelhança das descrições do castigo da humanidade por um dilúvio, Ovídio escreveu as Metamorfoses antes do ano 8 d.C., pelo que é improvável que alguma vez tenha tido contacto com as crenças hebraicas, então apenas situadas num cantinho do Império quase não romanizado. Quer porque a Palestina se situava muito longe de Roma e da Grécia onde viveu e viajou, quer porque antes do Cristianismo, as religiões monoteístas eram muito reservadas e não tinham pretensões de expansão, pelo que não havia implantação apreciável de uma cultura judaica/judaico-cristã em Roma.

Acho apenas interessante que esta noção de uma era de pecado passado longínqua seguida por uma punição por dilúvio seja comum, aparentemente, a várias culturas e religiões da Antiguidade que não contactaram quase nada entre si.

Donnerstag, 3. Februar 2011

Crónicas da vida Real



Não quero, de todo, perpetuar esta discussão;
mas pergunto-me se algum presidente faria tal...

Samstag, 29. Januar 2011

Primeiras impressões da Escandinávia...

Caros leitores,

Três semanas após a minha chegada a Helsínquia, tenho finalmente o repouso e tempo suficientes para me apresentar pessoalmente a todos vocês e para escrever um texto introdutório para o que espero vir a relatar nos próximos meses. Quero antes de mais agradecer ao meu querido amigo Filipe pelo convite para me juntar a este blog; espero que o meu contributo faça “florescer” ainda mais este Jardim!

Para aqueles que ainda não me conhecem, sou uma estudante de Teatro e Música, e foi o desejo de aprender mais noutro país com uma escola e cultura diferentes que me fez vir até cá tão longe da minha vida em Portugal e de todos os meu familiares e amigos próximos para um semestre de Erasmus.

Antecipei a minha aventura na Finlândia com uma viagem pela Suécia e Lapónia; achei que seria o melhor para mim, visto que é mais que sabido que um corpo lusitano não se adapta de um dia para o outro à realidade de uma vida na Escandinávia; além disso, era um óptimo pretexto para viajar um pouco. Sendo assim, deixei Lisboa no dia 26 de Dezembro rumo a Estocolmo e, após dias de intermináveis passeios pela cidade, parti numa viagem até à Lapónia, conhecida não só por ser a alegada morada do Pai Natal, mas também pelas suas deslumbrantes paisagens naturais, noites polares e Auroras Boreais. Durante a semana que passei por lá, tive o privilégio de usufruir de tudo isto. Em suma, tenho a dizer que a Lapónia é, sem qualquer dúvida, um dos sítios mais bonitos que já visitei. Aguardo com muita expectativa a oportunidade de ir lá no próximo Verão, porque nessa altura terei ao meu dispor coisas completamente diferentes para conhecer e experienciar.

Por fim, cheguei a Helsínquia e pude finalmente deparar-me com a cidade onde vou ficar a estudar durante os próximos meses. Levei bem mais de uma semana a habituar-me e a conseguir orientar-me minimamente por aqui (apesar de se tratar de uma cidade relativamente pequena). As poucas horas de luz solar faziam com que as ruas me parecessem quase todas iguais, e depois quase não tinha coragem para sair de casa por causa do cansaço e, acima de tudo, por causa do frio que se faz sentir por aqui diariamente. Nessa fase inicial, sempre que ia à rua, ficava tão perdida que quando finalmente voltava a dar com a minha casa, já estava completamente gelada.

Creio que esses foram os dias mais estranhos para mim. Assim que as aulas começaram e me obriguei a sair à rua com mais frequência, comecei a aperceber-me do encanto desta pequena cidade e a sentir-me muito feliz por estar aqui. As temperaturas geladas? Habituei-me. Andar na rua com -5 Cº já não me faz confusão (claro que há dias em que fica especialmente frio, com cerca de -15 Cº). E, mesmo só estando cá há um mês, já noto que os dias estão muito maiores (apesar de às 17h já ser noite cerrada; para quem achar isto surpreendente, volto a recuar no tempo: quando cheguei à Escandinávia, as 15.30h já não havia qualquer luz solar), por isso a escuridão também já não me afecta tanto como no início.

E aqui fica o meu primeiro parecer sobre o que é a vida de uma portuguesa em Helsínquia. Nos próximos tempos cá voltarei para partilhar convosco as experiências que estou a viver aqui na Finlândia.

Até breve!

Moikka!

Samstag, 22. Januar 2011

Reflicta-se e discuta-se.


Caro Ars Vitae,

Caros leitores,

Gostava de agradecer, mais uma vez, o convite que me foi feito pelo meu amigo Filipe, para que deixasse de ser alguém que aprecia, observa e colhe o produto por vós exposto e passar a ter um pequeno canteiro para cultivar algumas plantas neste tão grande Jardim.

É para mim uma grande honra fazer parte deste – agora, nosso ARS VITAE. Procurarei sempre manter a grandiosidade e elevação das discussões a que vós nos habituais, embora o não garanta nunca (!). Espero que gostem da minha estadia por cá. E aproveito para começar:


Em vésperas de Eleições para a Presidência da República Portuguesa pedem que reflictamos. Hoje é "Dia de Reflexão" - Façamos pois a vontade aos nossos donos e senhores, os nossos governantes:

Quando se fala em Monarquia vem sempre aliada alguma confusão e mistura ou com contos de fadas e histórias de encantar ou com eventos que embora tenham acontecido, não são nossos: Não são Portugueses.

Por ora, resta-me deixar de parte algumas precisões históricas que se vêem tornado verdades na cabeça de muitos - não se sabe bem como (será?), para entrar numa exposição residual e muito introdutória sobre a Monarquia em Portugal.

Como principio de conversa, devo dizer que não venho aqui expor os motivos de meus ódios para com a república; mas não posso deixar de admitir uma grande indignação que tenho para com esta última. A título de exemplo, infelizmente, o “Portugal” que foi fundado no Séc. XII desapareceu em 1910. Desapareceu até hoje. Hoje, o “país à beira mar plantado” tem um outro nome, chama-se República Portuguesa. Para mim, todos os substantivos deste tipo carregam sobre si um peso histórico e devem manter-se o mais fieis possíveis, de geração em geração.

Confesso tal indignação aqui neste jardim na certeza de que todos os nossos leitores tem uma sensibilidade não só histórica como estética, e que lhe dão a esta o seu devido destaque. Entendo que se desvirtuou nome tão grandioso para algo relativamente banal, passamos de Portugal para República Portuguesa. Por outro lado, cometeu-se o erro crasso de confundir o nome de um povo e de um Estado com o próprio Regime. Minhas Senhoras e Meus Senhores, o nome oficial do pais dos portugueses é esteticamente mau e ao mesmo tempo renega toda a história de um povo que antecede a implantação do regime republicano, é esta a verdade. Mas, nem tudo é mau: o povo lusitano nunca esqueceu o nosso verdadeiro nome e a prática tem vigorado contra legem, no sentido de fazer juz ao nome: Portugal.

Acabado o desabafo cumpre passar à matéria que me aqui trás hoje.

Monarquia é pois, o Regime politico que reconhece na autoridade Real a Chefia de um Estado. O Rei representa todo o passado colectivo e a herança cultural de uma Nação.

(Não se tornará necessário explicar que é obvio que não existe nenhuma incompatibilidade entre democracia e Monarquia constitucional. Relembre-se que Monarquia não simboliza despotismo, mas caso sobrem dúvidas quanto a este ponto a ele retomarei numa próxima oportunidade).

Quanto a mim, é público que defendo a Monarquia Portuguesa: uma Res Publica com Rei, de acordo com a racionalidade e liberdade da Pessoa Humana, com os limites naturais da condição do Homem e do respeito pela Constituição Democrática de um Estado de Direito. Trata-se de querer que, a mais alta patente da nação, seja educada desde terna idade para se despojar de si e dos seus desejos pessoais, para servir em permanência e sem cessar o seu povo e os seus superiores interesses. De querer que o nosso mais alto representante tenha uma instrução que prepare para desprendimento do que é Próprio em função do Colectivo. Mas não só. É complementada por uma aprendizagem da arte da diplomacia, de reforço da história e da cultura portuguesa, do conhecimento deste Povo e das suas potencialidades; através de situações reais e concretas, que lhe são mostradas pelos seus formadores e por seu pai, em especial, que se vê a braços com os problemas efectivos do País.

No plano interno, o Rei e a Família Real são elementos muito importantes (e a meu ver imperiosos) enquanto símbolos e reforço da livre afirmação da identidade do povo português, nas suas diversidades e nas suas potencialidades regionais e locais. O Rei assegura a identidade e a soberania portuguesa de forma firme, estável e coesa no quadro das relações internacionais. Por fim, surge como baluarte na ligação intima que todos os portugueses têm, com os países falantes de língua portuguesa que nos poderiam propiciar grandes momentos de diversidade cultural e de crescimento mutuo, tanto na África como na América, Oceânia e até na Índia.


Meus amigos: defendo um Rei que é escolhido pelos próprios titulares da soberania: o povo, ao contrario de outros regimes monárquicos. Repare-se que em Portugal o monarca foi sempre aclamado em Cortes, nunca vigorou entre nós a máxima Le Roi Est Mort, Vive Le Roi!, nunca, entre nós, reinou alguém que não tenha sido pelos portugueses aprovado.


No nosso tempo, o Rei seria factor de grande estabilidade politica e de continuidade, na medida em que a sua magistratura seria completamente independente da “Partidocracia” e dos grupos de pressão económico-financeiros ou de qualquer outra ordem. A figura real está construída, exclusiva e completamente, para Portugal e para os Portugueses através de exercício do poder arbitral e moderador por forma a garantir o funcionamento harmonioso e democrático das instituições. Sempre de forma livre, desinteressada e completamente preocupada com os que mais carecem de protecção! Repare-se que o Rei não Governa.


Para finalizar este pequeno preambulo, não posso deixar de mostrar factores não meramente culturais e políticos, já que a Monarquia constitui uma forma de organização política mais económica do que a República. Numerosos estudos comprovam que a Presidência da República portuguesa custa 5 vezes mais que a Casa Real Espanhola, e que portanto diariamente os portugueses estão a pagar mais para a manutenção de um regime podre que se vem deteriorando, do que teria que dispendar para os encargos do Estado numa Monarquia.
(ver aqui)


Escrevo estas palavras com intenção de ser um texto de carácter mais técnico e racional, e menos empolado (como provavelmente esperariam) com vista a facilitar futuras discussões que certamente se seguirão!

“A história diz-nos quem fomos, mas é a política que nos diz o que iremos ser.” (J. Hernano Saraiva): Queira deus que Portugal se reencontre, na sua verdadeira identidade. Queira o povo portugues que nos tornemos de novo uma Monarquia!

Viva S.A.R. El-Rey de Portugal!

Bem hajam,

HSC